Carlos Alberto Sardenberg, O Globo
Dez de maio de 2017, em Curitiba. O juiz Moro, na série de
questões sobre a influência de Lula na Petrobras, pergunta a respeito da
refinaria do Nordeste, especialmente se o ex-presidente sabia por que custava
tão mais caro do que o previsto. Lula: Não sei. Acrescentou que a estatal era
independente.
17 de setembro de 2009. Em entrevista ao jornal “Valor
Econômico”, Lula conta que a Petrobras lhe apresentara um plano adiando
investimento e sem previsão de novas refinarias. E o que fez o então
presidente? “Convoquei o Conselho da Petrobras...”, responde Lula, direto.
Resultado, não uma, mas quatro refinarias projetadas, inclusive aquela do
Nordeste, da qual Lula fazia questão.
O PIB do Brasil ainda seria negativo em 2009, mas naquele
fim de ano já estava claro que o país deixara a recessão para trás. Lula
apresentou-se triunfante na entrevista. A recuperação era coisa dele.
Bem diferente do Lula de hoje, em Curitiba. Se o atual diz
que não mandava no governo, que a Petrobras era independente, que o presidente
apenas encaminhava nomes indicados para a diretoria, o Lula de 2009 alardeava
seu poder sobre o governo e empresas do setor privado.
A linguagem deixava claro. Por exemplo: “Comprei um banco
que tinha caixa”, referindo–se à aquisição da Nossa Caixa pelo Banco do Brasil.
Ou: “Quando fui comprar 50% do Banco Votorantim, tive que me lixar para a
especulação”. Tratava-se de aquisição também feita pelo Banco do Brasil.
Especulação era, na verdade, a objeção de áreas do governo,
do pessoal que achava a operação um mau negócio. Também havia resistência à
compra da Nossa Caixa, então pertencente ao governo de São Paulo. Lula conta:
“Não foi fácil tomar a decisão de fazer o BB comprar a Nossa Caixa”.
Repararam? “Fazer o BB comprar...”
No depoimento de Curitiba, os advogados de Lula reclamaram
que o juiz Moro estava fazendo perguntas fora do processo, como aquela sobre a
refinaria do Nordeste. Moro explicou que a questão era saber a relação entre
Lula e seus subordinados, o que faz inteiro sentido. Se muitos dos subordinados
roubaram tanto em tão pouco tempo, em tantas áreas do governo, qual o
conhecimento que o presidente tinha ou deveria ter?
Pois o Lula de 2009 se apresentava como o dono do governo e
com poder, e disposição, para influir no setor privado. Isso o torna
responsável por muita coisa, inclusive pelos desastres de gestão, corrupção à
parte. É o custo Lula.
A refinaria do Nordeste, pura determinação de Lula, deveria
ser uma sociedade meio a meio com a PDVSA venezuelana, que entraria no negócio
com dinheiro e óleo. E a coisa custaria em torno dos US$ 4 bilhões. Pois já no
governo Dilma, a então presidente da Petrobras, Graça Foster, informava que a
refinaria custaria US$ 17 bi, estava atrasada e ficara inteiramente por conta
da estatal brasileira.
Como uma empresa como a Petrobras poderia ter cometido um
erro desse tamanho? Simples. A estatal não tinha projeto nenhum para isso. “Se
dependesse da Petrobras, ela não gostaria de fazer refinarias”, disse Lula na
célebre entrevista ao “Valor”. Pois o então presidente decidiu, a diretoria
improvisou umas plantas, chutou 4 bi de dólares, e assim se construiu mais um
prejuízo bilionário, mesmo que não tenha sido roubado um centavo.
A compra do Votorantim deu um prejuízo de R$ 1 bilhão para o
BB, logo no primeiro ano. O negócio só foi bom para os acionistas do
Votorantim.
É interessante que, na mesma entrevista ao “Valor
Econômico”, os jornalistas observam que isso de o governo mandar os bancos
públicos comprar e emprestar já tinha levado instituições à quebradeira. Lula:
“Emprestar dinheiro para amigo? Isso acabou”.
Terá sido por acaso que os maiores clientes do BNDES, por
exemplo, sejam também os maiores financiadores de campanhas.
Lava-Jato à parte, há um custo Lula, que vai do buraco nas
contas públicas até os prejuízos das estatais. Lula fez com que a Petrobras
projetasse quatro refinarias, todos tipo maior do mundo. Duas, as do Ceará e
Maranhão, não saíram do projeto e, mesmo assim, deixaram um prejuízo de R$ 2,5
bilhões. Duas foram construídas, a do Nordeste e a do Rio, o Comperj — ambas
não terminadas, ambas muito mais caras que o previsto e provavelmente não
lucrativas. Estavam certos os técnicos que não gostavam de fazer refinarias.
Estavam todos errados ao aceitar a determinação do então presidente. Poderiam
ter recusado?
Se o Lula de hoje está certo, a diretoria da Petrobras era
independente e poderia ter recusado. Ou seja, o que o Lula de hoje está dizendo
é que os culpados são as diretorias da estatal e os políticos que indicaram
seus diretores. Mas quem era aquele de 2009?
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