domingo, 21 de maio de 2017

RECORDANDO CARLOS LACERDA

Memória – Há exatos 40 anos, morria Carlos Lacerda. Carlos Frederico Werneck de Lacerda (Vassouras, 30 de abril de 1914 – Rio de Janeiro, 21 de maio de 1977), jornalista e político brasileiro. Foi membro da União Democrática Nacional (UDN), vereador (1945), deputado federal (1947–55) e governador do estado da Guanabara (1960–65). Fundador (em 1949) e proprietário do jornal Tribuna da Imprensa, assim como criador (em 1965) da editora Nova Fronteira.
Origens
Carlos Lacerda nasceu em Vassouras, cidade localizada no sul do estado do Rio de Janeiro, cidade onde seu avô residia e seu pai tinha grandes interesses políticos. Recebeu o nome de Carlos Frederico como homenagem aos pensadores políticos Karl Marx e Friedrich Engels. Era filho do político, tribuno e escritor Maurício de Lacerda (1888–1959) e de Olga Caminhoá Werneck (1892–1979), sendo neto paterno de Sebastião Lacerda, ministro do Supremo Tribunal Federal e ministro dos Transportes no governo de Prudente de Morais. Pela família materna, era bisneto do botânico Joaquim Monteiro Caminhoá, trineto do barão do Ribeirão, descendente direto de Inácio de Sousa Vernek, cuja família tinha importante influência política e econômica na região; sobrinho-bisneto do barão de Maçambara, do visconde de Cananeia, do barão de Avelar e Almeida, da baronesa de Werneck, sobrinho-trineto do barão de Santa Fé e sobrinho-tetraneto do 1.º barão de Santa Justa. Seus pais eram primos, descendentes em linhas afastadas de Francisco Rodrigues Alves, o primeiro sesmeiro da cidade de Vassouras. Por outro lado, embora tivesse sobrenome parecido com o do 2.º barão de Pati do Alferes, o seu sobrenome Lacerda origina-se de seu bisavô, um pobre confeiteiro português que se estabeleceu em Vassouras e se casou com uma descendente de Francisco Rodrigues Alves (estes serão os pais de seu avô paterno, Sebastião Lacerda).  Seu bisavô português chamava-se João Augusto Pereira de Lacerda e pertencia a uma das principais famílias da nobreza açoriana, os Lacerdas do Faial, descendentes das nobres famílias dos Pereiras, senhores da Feira, e dos Lacerdas, descendentes dos reis de Castela e Leão e dos de França.
Ingressou em 1929 no curso de Ciências Jurídicas e Sociais da então Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro, atual Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Durante seu período acadêmico, destacou-se como orador e participou ativamente do movimento estudantil de esquerda no Centro Acadêmico Cândido de Oliveira. Devido ao grande envolvimento em atividades políticas, abandonou o curso em 1932.
Tornou-se militante comunista, seguindo os passos de seu pai, Maurício de Lacerda, e dos seus tios Paulo Lacerda e Fernando Paiva de Lacerda, antigos militantes do Partido Comunista Brasileiro (PCB).
Sua primeira ação contra o governo de Getúlio Vargas implantado com a revolução de 1930 deu-se em janeiro de 1931, quando planejou, junto com outros comunistas, incentivar marchas de desempregados no Rio de Janeiro e em Santos durante as quais ocorreriam ataques ao comércio. A conspiração comunista foi descoberta e desbaratada pela polícia liderada por João Batista Luzardo, o que até virou notícia no jornal estadunidense The New York Times.
Em março de 1934 leu o manifesto de lançamento oficial da Aliança Nacional Libertadora (ANL), entidade ligada ao Partido Comunista do Brasil, em uma solenidade na cidade do Rio de Janeiro à qual compareceram milhares de pessoas.
No ano seguinte publicou, com o pseudônimo de Marcos, um livreto contando a história do quilombo de Manuel Congo. Apesar do viés de propaganda comunista juvenil, o livreto resultou da primeira pesquisa histórica feita sobre um assunto que fora quase esquecido.
Quando ocorreu o fracasso da Intentona Comunista de 1935, teve que se esconder na velha chácara da família em Comércio (atual Sebastião Lacerda, Vassouras) e ser protegido pela família influente.
Rompeu com o movimento comunista em 1939, dizendo considerar que tal doutrina "levaria a uma ditadura, pior do que as outras, porque muito mais organizada, e, portanto, muito mais difícil de derrubar". A partir de então, como político e escritor, consagrou-se como um dos maiores porta-vozes das ideologias conservadora e direitista no país, e grande adversário de Getúlio Vargas, e dos movimentos políticos trabalhista e comunista, sendo contado como um dos principais oradores da ‘Banda de música da UDN’
O anti-Getúlio
Inimigo político de Getúlio Vargas, Carlos Lacerda foi o grande coordenador da oposição à campanha de Getúlio à presidência em 1950 e durante todo o mandato constitucional do presidente, até agosto de 1954. Uniu-se a militares intervencionistas e aos partidos oposicionistas (principalmente a UDN) num esforço conjunto para derrubar o presidente Vargas através de acusações que publicava em seu jornal, Tribuna da Imprensa.
Lacerda foi vítima de atentado a bala na porta do prédio onde residia, número 180 da rua Tonelero, em 5 de agosto de 1954, quando voltava de uma palestra no Colégio São José, no bairro da Tijuca. No atentado da rua Tonelero, morreu o major da aeronáutica Rubens Vaz, membro de um grupo de jovens oficiais que se dispuseram a acompanhá-lo e protegê-lo das ameaças que vinha sofrendo. Atingido de raspão em um dos pés, Lacerda foi socorrido e medicado em um hospital. Lá mesmo, acusou os homens do Palácio do Catete, sede do poder executivo, como mandantes do crime.
A pressão midiática e a comoção pública com a morte do major Rubens Vaz obrigaram o governo a instaurar um IPM para investigar o atentado. Rapidamente, os militares ligados a Lacerda fizeram do inquérito o palco perfeito para fomentar ainda mais a crise. Uma série de investigações levou à prisão dos autores do crime, que confessaram o envolvimento do chefe da guarda pessoal de Vargas, Gregório Fortunato e do irmão do presidente, Benjamim Vargas.
Com a conclusão do IPM (chamado na imprensa de "República do Galeão") instaurado pelo Brigadeiro Nero Moura, Ministro da Aeronáutica, o presidente do Inquérito, indicado pelo Ministro, Coronel João Adil de Oliveira informou, em audiência com o presidente Vargas, que havia a existência de indícios sólidos sobre a participação de membros da Guarda no atentado.
Dezenove dias depois, com o agravamento da crise política e o ultimato das Forças Armadas pela sua renúncia, Getúlio Vargas se suicidou com um tiro no peito em 24 de agosto. O suicídio reverteu a opinião pública e provocou uma imensa onda de comoção e revolta. Isso obrigou Lacerda e parte de seu grupo a deixar o país. Na época, milhares de revoltosos tomaram as ruas, empastelando jornais ligados à oposição.
Lacerda e a posse de Juscelino
Lacerda participou ainda de nova tentativa de golpe de estado em 1955, quando se uniu aos militares e à direita udenista para impedir a eleição e a posse do presidente eleito Juscelino Kubitschek e seu vice-presidente, João Goulart.
As manobras intervencionistas começaram já no período eleitoral, quando ocorreu o episódio da Carta Brandi, uma notícia supostamente falsa plantada pelos opositores no jornal de Lacerda que envolvia João Goulart num pretenso contrabando de armas da Argentina para o Brasil.
Após a eleição de Juscelino, Carlos Luz, presidente interino à época, aliado aos militares e a Carlos Lacerda, tramaram uma nova intervenção. A bordo do Cruzador Tamandaré, fizeram a resistência, no entanto o navio fora alvejado a tiros pela artilharia do exército a mando do General Teixeira Lott, que tinha pretensões de se candidatar à presidência. Foi o último tiro de guerra disparado na Baía da Guanabara no Rio de Janeiro. Durante anos, o episódio ficou conhecido como o golpe de Lott.
Vencido na tentativa de intervenção, Lacerda partiu para um exílio breve em Cuba, que ainda estava sob o regime do caudilho Fulgencio Batista, antes de Fidel chegar ao poder através da Revolução Cubana.
Voltou em seguida para reassumir sua cadeira de deputado e continuar a oposição a Juscelino Kubitschek, atacando, entre outras coisas, a construção de Brasília.
Juscelino não permitiu jamais o acesso de Carlos Lacerda à televisão. Juscelino confessou a Lacerda, no encontro de Lisboa em 1966 que, se deixasse Lacerda falar na televisão, Lacerda o teria derrubado do governo.
Governador da Guanabara
Em 24 de Agosto de 1961, Lacerda fez um discurso em cadeia nacional de rádio e televisão, atacando o presidente Jânio Quadros, antigo aliado. A renúncia de Jânio ocorreu no dia seguinte, em 25 de agosto.
Com a transferência da capital para Brasília, candidatou-se ao governo do recém-criado estado da Guanabara. Apesar do grande favoritismo inicial, Lacerda foi eleito por pequena margem, tendo sido ajudado pela divisão de votos populares que ocorreu com a candidatura de Tenório Cavalcanti ao mesmo cargo.
O seu governo do antigo estado da Guanabara destacou-se pela construção de grandes obras que mostraram suas habilidades de administrador e consolidaram a simpatia da classe média. Seu Secretário de Obras foi o eminente engenheiro civil e sanitarista Enaldo Cravo Peixoto. Construiu a estação de tratamento de água do Guandu, e um sistema de distribuição que resolveram um centenário problema de abastecimento (a falta de água era crônica e inspirava marchinhas de carnaval como "Rio de Janeiro, /cidade que nos seduz, / de dia falta água, / de noite falta luz" - Sucesso de Vitor Simon e Fernando Martins, do Carnaval de 1954). Construiu túneis importantes para o trânsito de veículos, como o Santa Bárbara e o Rebouças, ligando a Zona Norte à Zona Sul da Cidade do Rio de Janeiro. Terminou a construção e reurbanização do aterro do Flamengo. Removeu favelas de bairros da zona sul e Maracanã, criando o parque da Catacumba, o campus da UEG (atual UERJ), e instalando seus antigos habitantes em conjuntos habitacionais afastados como Cidade de Deus e Vila Kennedy. Construiu inúmeras escolas e manteve um alto padrão de qualidade dos hospitais públicos.
Durante seu governo, foi divulgado que policiais assassinavam os mendigos que perambulavam pela cidade e jogavam seus corpos ao rio da Guarda, afluente do rio Guandu. O governo de Carlos Lacerda foi acusado pela imprensa de oposição de ter dado instruções aos policiais para que realizassem estes assassinatos. Lacerda demitiu o Secretário de Segurança e o envolvimento dos escalões superiores do governo nestes fatos nunca foi provado.
Foi um dos líderes civis do golpe militar de 1964, porém voltou-se contra ele em 1966, com a prorrogação do mandato do presidente Castelo Branco. Segundo Lacerda, a prorrogação do mandato de Castelo Branco levaria o recém instalado governo "revolucionário" consolidar-se numa ditadura militar permanente. Confiava no sucesso do governo que tinha realizado no estado da Guanabara para enfrentar o candidato de oposição Juscelino Kubitschek.
A 22 de Julho de 1964 foi agraciado com a Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo de Portugal.
A desilusão com 1964 e a cassação
Em novembro de 1966, lançou a Frente Ampla, movimento de resistência ao Regime militar de 1964, que seria liderada por ele com seus antigos opositores João Goulart e Juscelino Kubitschek. Foi cassado em dezembro de 1968 pelo regime militar, levado preso para um Regimento de Cavalaria da Polícia Militar, onde ficou na mesma cela que Mário Lago - antigo companheiro seu de PCB, com quem não falava há décadas.
Morreu na clínica São Vicente, vítima de infarto no miocárdio. O fato de três líderes da Frente Ampla terem morrido em datas próximas levantou uma teoria de que essas mortes pudessem estar relacionadas, o que nunca foi comprovado.
Em 20 de maio de 1987, através do decreto federal nº 94.353, teve restabelecidas, post mortem, as condecorações nacionais que foram retiradas e reincluído nas ordens do mérito das quais fora excluído em 1968.
Empresário e escritor
Em 1965 fundou a editora Nova Fronteira, que publicou importantes autores nacionais e estrangeiros, inclusive o dicionário Aurélio (de 1975 até 2004).
Escreveu numerosos livros, entre eles O Caminho da Liberdade (1957), O Poder das Ideias (1963), Brasil entre a Verdade e a Mentira (1965), Paixão e Ciúme (1966), Crítica e Autocrítica (1966), A Casa do Meu Avô: pensamentos, palavras e obras (1977).
Depoimento (1978) e Discursos Parlamentares (1982) foram compilados e publicados após a sua morte.
Herdeiros políticos
O nome de Carlos Lacerda foi usado pelo seu sobrinho-neto, Márcio Lacerda, para se promover como homem público, usando-se disso para se promover na política. E à medida que cresciam as influências das forças de esquerda depois da Ditadura, evitou a associação do nome de seu tio-avô ao conservadorismo.
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