Deputados federais e senadores que eram sócios de emissoras
de rádio ou TV repassaram as cotas de sociedade para filhos, irmãos, pais e
aliados políticos.
As transferências foram feitas após a instauração de
inquéritos e de ações civis públicas, movidos pelo Ministério Público Federal
em 2015, questionando as concessões em nome de parlamentares.
A Constituição diz que deputados e senadores não podem
firmar e manter contratos diretos com a administração pública ou ser concessionários
de serviços públicos.
A Justiça, contudo, tem apresentado entendimentos diferentes
quanto à legalidade do repasse de cotas de ações de emissoras de políticos a
seus parentes.
Um exemplo: o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) deu lugar à
filha Giovana Barbalho na sociedade da Rádio Clube do Pará. Em junho, um juiz
federal suspendeu as transmissões da emissora sob o argumento de que o quadro
de sócios da empresa segue constituído por "outros membros da
família".
Já em Minas Gerais, o Tribunal Regional Federal entendeu que
o fato de Aécio transferir, em setembro de 2016, suas ações na rádio Arco Íris
–44% do capital da emissora– à irmã, Andréa Neves, anulava irregularidades na
concessão, já que ele havia saído da sociedade. O MPF recorreu e ainda não há
decisão.
IMPASSE JURÍDICO
Pedro Machado, procurador do Ministério Público Federal em
São Paulo que encaminhou 45 denúncias contra concessões a parlamentares pelo
país, diz que o repasse de cotas a parentes virou um impasse jurídico.
"Nós entendemos que, a partir do momento em que optou
por ser parlamentar, o político tem que abrir mão dessa concessão", diz.
Entre os parlamentares que se valeram de parentes para
repassar as concessões está o senador José Agripino Maia (DEM-RN), que vendeu a
dois irmãos e à mãe cotas de uma rede de televisão e de emissoras de rádio no
Rio Grande do Norte.
"Essas emissoras pertenciam ao meu pai, recebi por
herança. Mas houve esse questionamento, optei por vender as ações para meus
irmãos e minha mãe. Não queria prejudicá-los", afirma. O processo contra
ele foi extinto.
O filho de Agripino, o deputado federal Felipe Maia
(DEM-RN), abriu mão da participação em duas rádios na qual era sócio, vendendo
para primos. O senador Tasso Jereissatti (PSDB-CE) e os deputados Beto Mansur
(PRB-SP) e Domingos Neto (PSD-CE) também repassaram as ações de emissoras de
rádio e TV para parentes. Os dois primeiros para os filhos, o segundo para o
pai.
Além da rádio de Jader e Elcione Barbalho, outras duas
emissoras foram temporariamente suspensas por meio de decisão liminar. Em 2016,
a AM Show, de Jardinópolis (SP), que teve o deputado federal Baleia Rossi
(PMDB-SP) como sócio, foi retirada do ar.
O deputado contesta a decisão alegando que vendeu sua
participação na rádio para o irmão em 2015, quando assumiu mandato de deputado.
No mesmo período, também foi retirada do ar a rádio Metropolitana Santista, de
Santos, do deputado federal Antônio Bulhões (PRB-SP).
Apesar das contestações judiciais, há políticos que
continuam no quadro societário de rádios e TVs. Eles alegam que as restrições
seriam apenas para exercer cargos executivos na direção das empresas.
Há três ações sobre o tema em tramitação no STF (Supremo
Tribunal Federal). Duas pedem a inconstitucionalidade das concessões de rádio e
TV para qualquer político com cargos eletivos, não só deputados federais e
senadores.
Outra, proposta pelo governo Michel Temer (PMDB) em dezembro
de 2016, pede a suspensão de todos os processos envolvendo concessões de
parlamentares com mandatos e das liminares que interromperam a transmissão de
rádios e TVs até o julgamento final dos casos.
Segundo o governo, o direito à liberdade de expressão é
soberano e a legislação eleitoral já tem mecanismos para coibir o abuso de
poder nos meios de comunicação.
O pedido foi indeferido pela ministra Rosa Weber, mas,
devido a um recurso, o caso permanece inconcluso.
OUTRO LADO
O senador Jader Barbalho (PMDB-PA) afirmou que transferiu
suas cotas em emissoras de rádio e televisão para herdeiros, mas não comentou o
teor da ação civil pública que levou à suspensão de uma das rádios da família.
Tasso Jereissatti (PSDB-CE) informou apenas que "se
desfez das ações de uma rádio e uma TV".
O deputado federal Beto Mansur (PRB-SP) disse que fez tudo
dentro da lei e repassou as ações para os filhos para cumprir o que determinava
o Ministério Público Federal.
Domingos Neto, deputado pelo PSD-CE, diz que a rádio
Difusora dos Inhamuns existe há 34 anos, "antes do nascimento" do
parlamentar.
Ele afirma que devolveu as cotas ao pai em junho de 2016
"devido às inúmeras atividades que foi acumulando como deputado".
O deputado Baleia Rossi (PMDB-SP) afirma que não possui
participação societária em nenhuma rádio desde 2015, quando assumiu mandato na
Câmara.
Diz que vendeu ações de uma das rádios para seu irmão, um
"reconhecido profissional de comunicação", e critica a decisão que
tirou a emissora do ar.
"A decisão do desembargador é permeada por análise,
suposições e especulações. A mesma foi objeto de interposição de recuso pelo
deputado há um ano, mas até agora não houve uma decisão, afirmou em nota.
A reportagem procurou todos os 29 deputados e senadores,
alvos de denúncias, inquéritos e ações civis públicas movidos pelo Ministério
Público Federal em razão de concessões de rádio e TV, mas a maioria não
respondeu à reportagem.
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