Editorial O Estado de S.Paulo
Se havia ainda algum resquício de dúvida de que o presidente
Nicolás Maduro e seus asseclas do regime chavista estão mesmo dispostos a ir às
últimas consequências para manter e reforçar cada vez mais a ditadura que
estabeleceram na Venezuela, ele acaba de desaparecer. Não contente com a farsa
do golpe da tal Assembleia Constituinte – programada para, com maioria
assegurada de antemão ao chavismo, apagar os últimos traços de democracia no
país, a começar pela Assembleia Nacional onde a oposição é majoritária –, 48
horas depois de sua “eleição” Maduro determinou a volta ao cárcere de dois dos
principais líderes da oposição.
Leopoldo López, líder do Partido Voluntad Popular, que
estava em prisão domiciliar desde 8 de julho, depois de ficar preso três anos e
cinco meses, e Antonio Ledezma, prefeito de Caracas, detido em 2015 por três
meses e desde então em prisão domiciliar, foram levados por policiais do
Serviço Secreto (Sebin) ao presídio militar Ramo Verde, por ordem do Tribunal
Supremo de Justiça (TSJ), controlado pelo governo, acusados de dar declarações
de cunho político e de planejar fugir do país.
A prisão dos líderes oposicionistas provocou forte e
imediata repercussão internacional. A começar pelo Brasil, que ocupa a
presidência do Mercosul e instou o governo Maduro a “libertar imediatamente
López e Ledezma”, lembrando que a medida foi tomada apenas “um dia depois de
uma votação para eleger uma Assembleia Constituinte em franca violação da ordem
constitucional venezuelana”. Dos Estados Unidos à União Europeia (UE), o
sentimento é o mesmo. O secretário de Estado, Rex Tillerson, qualificou as
prisões de “alarmantes” e advertiu que a crise na Venezuela está piorando e que
os Estados Unidos estão “avaliando todas as opções”.
Na UE, sobe cada vez mais o tom das críticas dos
países-membros – especialmente da Espanha – ao governo Maduro, acusado de dar
“um passo na direção errada” com a prisão dos líderes oposicionistas. Sanções
contra a Venezuela começam a ser estudadas, embora medidas mais duras contra o
país ainda sofram resistência do governo grego.
A atitude de Maduro causou também surpresa porque, com a sua
Assembleia Constituinte de cartas marcadas – e cuja eleição, ainda por cima,
foi fraudada, como denunciou a própria empresa responsável pelas urnas
eletrônicas, a inglesa Smartmatic –, ele tinha acabado de dar mais um duro
golpe na oposição. Levar de volta à prisão militar, logo em seguida, dois de
seus líderes que já se encontravam em prisão domiciliar pareceu a todos –
dentro e fora do país – uma tentativa deliberada de acuar ainda mais a
oposição, fechando todas as portas ao diálogo para exigir dela nada menos que
uma rendição incondicional. Ou seja, a aceitação cabal da ditadura cuja fachada
é a Assembleia Constituinte.
O passo seguinte pode ser a neutralização definitiva da
Assembleia Nacional, na qual a oposição tem maioria. O artifício a ser usado
para isso é simples. O regime chavista já deixou claro que a Constituinte vai
se reunir no mesmo local que ela. É fácil imaginar que não demora muito a
Assembleia Nacional terá de ceder suas dependências para os constituintes de
Maduro, cujos “argumentos” para isso são bem conhecidos.
Além da força das milícias armadas e do controle de
instituições como os tribunais, o regime chavista se apoia também no aparelho
repressivo – o Serviço Secreto e as prisões onde a tortura contra os presos políticos
se generaliza, de acordo com documentos obtidos pela Organização dos Estados
Americanos (OEA). Eles mostram, de acordo com reportagem de Jamil Chade, que os
presos políticos venezuelanos – cujo número chega a 440 – estão sendo
submetidos a tratamentos bárbaros poucas vezes registrados nesse tipo de
história macabra.
É esse o “socialismo” do século 21 que os bolivarianos que
ainda restam na América Latina e o PT e o PCdoB teimam em aplaudir.
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