Os juízes federais anunciam uma greve no dia 15 de março. De
um modo geral, apoio os magistrados e os procuradores na sua luta contra a
corrupção.
Conseguiram avançar muito nesse campo. Muito mais do que
nós, que tentamos a mesma tarefa na política e acabamos neutralizados pela
aliança transpartidária dos bandidos.
Essa história do auxílio-moradia, no entanto, não é
facilmente defensável. O auxílio-moradia é definido para os que não têm casa
nos lugares para onde são deslocados.
Conheci juízes em Rondônia que viajam quilômetros, fazem
audiências em igrejas e dormem em redes. Um dos meus projetos de programa é
viajar com eles e mostrar o que acontece num lugar remoto, quando a Justiça
chega e começa a funcionar.
Esta menção é apenas para ressaltar o nível de
desprendimento e idealismo que encontro em muitos deles, alguns ameaçados de
morte.
Compreendo que o salário não satisfaz, não foi aumentado como
se prometeu. No entanto, o caminho de supri-lo com o artifício de uma gambiarra
é um equívoco.
A sociedade não aceita a insistência que pode colocar em
risco a própria luta contra a corrupção, pois abre uma brecha na valiosa
qualidade que é a coerência.
O Brasil vive momentos típicos de nossa cultura avessa à
precaução. Discutia-se até aqui a reforma da Previdência, até que a segurança
pública caiu na nossa cabeça.
Não tenho dúvidas de que, adiante, a Previdência Social
cairá também na nossa cabeça. Nesse momento, certamente não só a Justiça e as
próprias Forças Armadas como parte do funcionalismo público serão chamadas a
colaborar, adaptando-se ao inevitável esforço nacional.
Não há dúvida que existem riscos nesse processo. Um deles é
o deslocamento de bons profissionais para a iniciativa privada. Mas o que
fazer? O Estado não pode competir com ela, exceto com um salário digno e a
recompensa simbólica de estar servindo ao povo brasileiro.
Não acredito na eficácia de uma greve de juízes, embora
seja, indiscutivelmente, legal. Na verdade, creio que abre um flanco para os
adversários entrarem em cena, pois vivemos num país em que existe um grande
esforço mental para justificar a corrupção, seja desqualificando juízes e
procuradores, seja através da acrobacia mental dos que tudo perdoam a quem está
do mesmo lado.
Não somente Lula, mas muitos intelectuais afirmam que Sergio
Moro é um agente dos Estados Unidos incumbido de entregar o nosso petróleo.
Não comento frases de Lula, pois há muito defendi um habeas
língua para ele. No entanto, este é um movimento tradicional da esquerda
brasileira, o de fugir de seus erros e apontar para um inimigo externo.
Costumo citar um jornal comunista na Bahia que escreveu isso
depois de um choque entre manifestantes e polícia, durante a II Guerra: “Zeca
Patriota espancado a mando de Truman”.
Um tríplex no Guarujá pode ser tedioso. Mas ganha uma nova
dimensão quando banhado à luz da política internacional, como um instrumento de
agressão do império.
Infelizmente, a maioria dos políticos teme ou detesta os
juízes. Não há uma boa interlocução. No entanto, um desfecho razoável para esse
episódio é essencial, não só como problema salarial de uma categoria. Ele tem o
potencial de estremecer a forte aliança renovadora inaugurada com a Lava-Jato.
Artigo publicado no Globo em 03/03/2018
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