Na tarde de quarta-feira 28, um grupo de senadoras do PT e
de partidos aliados apareceu inadvertidamente no gabinete da presidente do
Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia. Pega de surpresa, Cármen
Lúcia se viu compelida a recebê-las. Entre outros assuntos, as parlamentares
foram tirar o sossego do mais importante gabinete do Judiciário brasileiro para
clamar pela liberdade do ex-presidente Lula. Cármen Lúcia as ouviu polidamente,
sem dar qualquer sinal de como irá proceder na condição de presidente da Corte
Suprema. Mas, a interlocutores, reconhece o incômodo com as indecentes pressões
que vem recebendo – a das senadoras não foram as primeiras. Embora seja ela o
alvo preferencial por ter a prerrogativa de preparar a agenda de julgamentos, Cármen
Lúcia não está sozinha nessa. Nos últimos dias, a presença de amigos de Lula
nos gabinetes do STF tem sido uma constante. A pressão é constrangedora pelo
aspecto eminentemente político que a permeia: os integrantes da romaria ao
Supremo são mais do que simples amigos do ex-presidente petista. São petistas
que tiveram peso decisivo durante o processo de nomeação dos mesmos ministros
que agora eles cortejam para que executem o serviço sujo, qual seja: livrar
Lula da prisão, em contrapartida ao que esses emissários representaram para
eles num passado nem tão distante.
Pressionados, ministros do STF mudaram de lado e passaram a
atuar para tentar isolar Cármen Lúcia
A tática é de guerrilha. Os prepostos de Lula, como o
ex-chefe de gabinete Gilberto Carvalho, os ex-ministros José Eduardo Cardozo e
Jaques Wagner, o ex-prefeito de São Bernardo Luiz Marinho e o deputado Vicente
Cândido apareceram com freqüência, nas últimas semanas, nas salas dos ministros
Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Dias Toffoli e até do relator da Lava Jato
no Supremo, Edson Fachin.
Mas nada é tão obsceno e contrário aos valores republicanos
que não possa descer ainda mais na escala da degradação institucional: segundo
apurou ISTOÉ, há entre os togados do STF quem tenha cedido à estratégia de
intimidação petista e até mudado de lado da trincheira. Convencidos a ajudar
Lula durante os encontros camaradas, passaram a atuar no corpo-a-corpo junto a
Cármen Lúcia para que ela coloque em pauta, o mais breve possível, a
rediscussão sobre a prisão em segunda instância.
O grande perigo por trás da análise sobre a prisão de Lula
vem de uma combinação explosiva que pode deixar fora das grades não apenas ele,
mas uma série de outros políticos e empresários envolvidos em casos de
corrupção. E é por isso que Cármen Lúcia tem resistido ao máximo em levar o
tema ao plenário do Supremo, apesar da marcação cerrada que tem sofrido não
somente de petistas e aliados do ex-presidente, mas também de alguns dos
próprios colegas. No STF, há hoje uma forte sensação de que a Corte poderá
alterar seu entendimento sobre a possibilidade de prisão em segunda instância,
caso o tema volte à baila. O Supremo já se manifestou três vezes sobre a
questão, e em todas as ocasiões prevaleceu o entendimento de que a prisão é possível,
ao término do julgamento em segunda instância. Na última vez, em novembro de
2016, o placar registrou 6 votos a 5. Ocorre, porém, que a operação do PT já
teria virado votos outrora contrários a Lula no tribunal. Interlocutores de
Cármen Lúcia dão como certo, por exemplo, que o ministro Gilmar Mendes é um dos
que teriam mudado de posição em benefício do ex-presidente. Não seria o único.
Interlocutores de Cármen Lúcia dizem que o ministro Gilmar
Mendes agora vota em benefício de Lula
A articulação de Sepúlveda
A estratégia no sentido de seduzir o Supremo foi
desencadeada a partir da contratação do ex-presidente do STF José Paulo
Sepúlveda Pertence para conduzir a defesa de Lula. Com Pertence, saiu de cena a
tática de confronto, levada ao extremo por Cristiano Zanin e equipe. Em seu
lugar, emergiu a articulação de quem conhece cada escaninho do STF e, cultiva,
como poucos, uma melíflua relação com a esmagadora maioria dos ministros da
Corte. Há dois ministros, em especial, que devem sua nomeação a Pertence. Em
2006, já perto de sua aposentadoria do STF, ele foi questionado pelo então
presidente Lula sobre quem ele indicaria para a sua cadeira que logo ficaria
vaga. Embora soubesse que seria voto vencido, Pertence recomendou os nomes de
Luís Roberto Barroso e de Cármen Lúcia. A vaga acabou ficando com Carlos
Alberto Menezes Direito, já falecido, por conta de um pedido do advogado Sérgio
Bermudes, seu dileto amigo. Mas Lula guardou aqueles nomes para sempre.
Recentemente, circulou a história de que Cármen Lúcia
poderia se declarar impedida de julgar casos envolvendo Lula pela sua
proximidade com Sepúlveda Pertence – o que não acontecerá. Houve até quem
dissesse que a presidente do STF é uma prima distante do advogado de Lula.
Pertence e Cármen são declaradamente amigos, mas ela não é parente do
ex-ministro.
Na última semana, Sepúlveda Pertence praticamente acampou no
Supremo. Um dos ministros que o receberam foi o relator da Lava Jato, Edson
Fachin. O encontro, registrado em sua agenda, durou mais de uma hora. Não se
questiona aqui a legitimidade do ministro em receber o advogado das partes.
Inadmissíveis, sim, são as indecorosas pressões exercidas por emissários
incontestavelmente ligados a um réu condenado em primeiro e segundo graus, que
em nada guardam relação com o processo, e que estão lá não em nome de uma causa
coletiva, mas para uma missão meramente casuística: a de livrá-lo das grades.
Desse time estrelado, Fachin recebeu Tião Viana, Luiz Marinho e Gilberto
Carvalho.
Nas costuras com o STF, o novo advogado do ex-presidente
conta sempre com a prestimosa ajuda de Sigmaringa Seixas, o homem de Lula nos
bastidores da Justiça, em Brasília, desde a chegada do PT ao poder. Dias
Toffoli, por exemplo, é um dos ministros que possuem uma dívida de gratidão com
Sig, como é conhecido. Em 2009, quando o então advogado-geral da União estava
entre os cotados para assumir uma vaga no STF, um outro nome em particular
povoava a mente e o coração de Lula: o de Sigmaringa. Toffoli sabia disso.
Tanto que deixou Lula à vontade para proceder a escolha. Mas Sig emprestou mais
doses de generosidade ao gesto do amigo: abriu mão da cadeira no Supremo em
favor de Toffoli.
A “Câmara de Gás”
Os passos da defesa de Lula, agora sob o comando de
Pertence, são bem calculados. O pedido de habeas corpus no STJ foi feito
propositalmente antes do recesso do Judiciário. Com isso, a defesa já sabia que
o pedido de liminar seria julgado ou pela presidente do STJ, Laurita Vaz, ou
pelo seu vice-presidente, Humberto Martins – quem julgou a liminar foi Martins,
que a indeferiu. Tudo dentro do previsto pela defesa de Lula. O indeferimento
de Martins leva o caso a ser julgado por um pleno, no caso, a Quinta Turma do
STJ, que examina os casos relacionados à Lava Jato, tendo como relator o
ministro Felix Fischer. O próprio PT já sabe que a tendência é que o habeas
corpus seja indeferido. Os petistas apelidam a Quinta Turma de “Câmara de Gás”,
por sua postura rigorosa em seus julgamentos. A estratégia, no entanto, foi
entrar com um pedido no STJ para que uma decisão do tribunal, mesmo
desfavorável, forçasse o Supremo a se posicionar na sequência.
São nessas fichas que o PT aposta. Dez em cada dez petistas
reconhecem que no Supremo repousam as derradeiras chances de Lula de escapar da
cadeia. Por isso, nas próximas semanas, tendem a se intensificar as investidas
do partido, contra as quais Cármen Lúcia, do alto do cargo mais importante da
República hoje, precisa se manter inexpugnável. Ante alguns de seus colegas de
cátedra, mais interessados em mesquinhas conveniências pessoais, hoje a
presidente do STF representa a resistência moralizadora. Enfim, é chegada a
hora de o Supremo se portar menos como uma soma de individualidades e mais como
um colegiado, guardião da Constituição. Se sobreviver, a democracia agradecerá.
“Os ministros não se dobrarão às pressões”
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da
República (ANPr), José Robalinho Cavalcanti, não acredita que os ministros do
STF se curvarão
Ultimamente, o gabinete de alguns ministros do Supremo vem
recebendo visitas de pessoas ligadas ao ex-presidente Lula. Isso não é uma
forma de pressão?
Se tiver só no entra-e-sai, acho que é normal. Agora, se
houve um tipo de constrangimento pessoal, aí ultrapassa os limites. Mas creio
que nenhum dos ministros vai se dobrar por qualquer tipo de pressão.
Mas não causa um constrangimento, por exemplo, a visita do
ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence ao relator da Lava Jato no STF Edson
Fachin, justamente agora que ele foi integrado à defesa de Lula?
Se ele está fazendo uma visita de cortesia, está errado.
Acha que o STF deve voltar atrás sobre a prisão em 2ª
instância ?
Seria o maior retrocesso recente da história. Seria
desastroso.
“Defendo a prisão em segunda instância”
O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil
(Ajufe), Roberto Carvalho Veloso, diz que os ministros do STF não julgarão sob
pressão
Recentemente, os ministros do STF têm recebido uma
verdadeira romaria de políticos e advogados ligados a Lula. Isso é legitimo?
A Constituição e o Estatuto da OAB asseguram aos advogados o
acesso aos magistrados. Portanto, é um trabalho legítimo o de entrega de
alegações de processos em curso aos juízes.
Essas visitas não soam como pressão para que os ministros
decidam em favor do réu?
A história de vida do ministro Sepúlveda Pertence indica que
ele age dentro da moralidade. Temos confiança nos ministros do Supremo Tribunal
Federal e eles não julgarão sob pressão de políticos.
O senhor é a favor da prisão após condenação em segunda
instância?
Sim. Historicamente, a Ajufe defende o início do cumprimento
da pena após o julgamento em segunda instância.
Operador de lula no supremo, o advogado Sigmaringa Seixas
teve papel determinante para que dias Toffoli Virasse ministro
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