Desde que a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos
Humanos, Damares Alves, assumiu uma cadeira no primeiro escalão do governo do
presidente Jair Bolsonaro, uma ferida de 15 anos atrás voltou a arder no Xingu.
A aldeia Kamayurá, no centro da reserva indígena no norte de Mato Grosso, é o
berço de Kajutiti Lulu Kamayurá, de 20 anos. Damares a apresenta como sua filha
adotiva. A adoção, porém, nunca foi formalizada legalmente. A condição em que a
menina, então com 6 anos de idade, foi retirada da aldeia é motivo de polêmica
entre os índios.
Lulu nasceu em 20 de maio de 1998, segundo seu registro.
ÉPOCA foi ao Xingu ouvir dos kamayurás a história da menina que foi criada pela
avó paterna, Tanumakaru, uma senhora de pele craquelada, cega de um olho. Eles
afirmam que Damares levou a menina irregularmente da tribo. Alguns detalhes se
perdem na memória dos índios, mas há um fio condutor que une o relato de todos
eles. Lulu deixou a aldeia sob pretexto de fazer um tratamento dentário na
cidade e nunca mais voltou. Contam que Damares e Márcia Suzuki, amiga e braço
direito da ministra, se apresentaram como missionárias na aldeia. Disseram-se
preocupadas com a saúde bucal da menina.
“Chorei, e Lulu estava chorando também por deixar a avó.
Márcia levou na marra. Disse que ia mandar de volta, que quando entrasse de
férias ia mandar aqui. Cadê?” Questionada sobre se sabia, no momento da partida
de Lulu, que ela não mais retornaria, foi direta: “Nunca”.
A ministra Damares Alves procurou ÉPOCA quando a reportagem
ainda estava no Xingu. Disse que estava “à disposição para responder às
perguntas (...) sobre nossas crianças, sobre minha filha e sobre as famílias”.
“Não temos nada a esconder. Mas insisto: tratem tudo com o olhar especial para
estes povos, para as mães e crianças que sofrem”, afirmou, via WhatsApp.
Em Brasília, no entanto, ela se recusou a dar entrevista e
respondeu apenas parcialmente a 14 questionamentos da revista. “Todos os
direitos de Lulu Kamayurá foram observados. Nenhuma lei foi violada. A família
biológica dela a visita regularmente. Tios, primos e irmãos que saíram com ela
da aldeia residem em Brasília. Todos mantêm uma excelente relação afetiva.”
Perguntamos por que Damares não devolveu a criança à aldeia após o tratamento.
“Lulu Kamayurá já retornou à aldeia. Ela deixou o local com a família e jamais
perdeu contato com seus parentes biológicos.” A questão sobre não ter adotado
formalmente Lulu foi ignorada.
Leia em ÉPOCA desta semana a reportagem completa sobre a
saída de Lulu Kamayurá de sua aldeia no Xingu e a atuação da ministra Damares
Alves em comunidades indígenas, a partir do relato de índios que vivem nesses
lugares, de famílias atendidas que defendem esse trabalho, da Funai e de
documentos de investigações.
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