Dois meses depois de tomar posse como presidente da
República com um discurso de que a partir de agora trabalharia para unir o
Brasil e os brasileiros, a impressão que ainda se tem de Jair Bolsonaro é a de
que ele continua em campanha. É até chato escrever isso. Torna-se repetitivo,
parece que o assunto não muda. Mas Bolsonaro tem agido mais como o combatente
que sempre foi nos quase 28 anos numa cadeira na Câmara dos Deputados do que o
presidente de todos os brasileiros.
Na Câmara, logo que assumiu seu primeiro mandato, em 1991,
Bolsonaro combateu pela melhoria das condições de trabalho dos militares em
marchas e concentrações junto com as mulheres de oficiais, repetindo o que
fizera como capitão do Exército, em 1986, ao escrever um artigo para a revista
Veja, no qual criticava os baixos salários nos quartéis. Foi preso por 15 dias,
por indisciplina, por causa de seu ponto de vista, mas conquistou simpatias de
colegas por todo o País. À frente, foi absolvido pelo Superior Tribunal Militar
(STM). Também como deputado combateu para ter o direito de matricular os filhos
no Colégio Militar de Brasília, atacou o governo de Fernando Henrique Cardoso,
que segundo ele prejudicou os militares, e até pregou o fuzilamento do
ex-presidente.
Ao longo de sua carreira de deputado, Bolsonaro
notabilizou-se também por combater os governos do PT, sua política de direitos
humanos, alguns colegas da Câmara, como a deputada Maria do Rosário (PT-RS) e o
ex-deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), que renunciou ao mandato e foi morar no
exterior, sob o argumento de que não se sentia mais seguro no País. Foi essa
mesma vocação para o combate que levou Bolsonaro à vitória, pois conseguiu
passar ao eleitor a mensagem de que era o candidato anti-Lula e anti-PT. Por
consequência, contra a corrupção e a favor de uma agenda conservadora nos
costumes, além de ser favorável à liberação da posse de armas.
Pois Bolsonaro já venceu a eleição. O Brasil continua com
problemas econômicos sérios, desemprego altíssimo, educação de baixa qualidade,
saúde precária, desigualdade social gritante, sistema de transporte ruim e
segurança pública de envergonhar. Frentes de batalha é que não faltam para o
presidente. Armas ele tem. Uma delas é o projeto de reforma da Previdência, que
pode ajudar a combater o déficit público e a melhorar a economia, além do
pacote de combate à corrupção e ao crime organizado e violento.
Como presidente, Bolsonaro deveria estar mesmo é preocupado
com a garantia de sua governabilidade, o que só será conseguido com a
construção de uma forte base de apoio no Congresso. Isso, até agora, não foi
feito. Logo, logo, tanto a reforma da Previdência quanto o pacote anticorrupção
começarão a tramitar. Portanto, é urgente formar essa base. Cabe ao presidente
encabeçar a articulação e lutar para que os projetos sejam aprovados.
Nessa semana, Bolsonaro desautorizou publicamente seus
ministros Paulo Guedes (Economia) e Sérgio Moro (Justiça), ao dizer que a idade
mínima para a aposentadoria da mulher pode baixar de 62 anos para 60, e ao
ordenar o desconvite para que a cientista política Ilona Szabó ocupasse uma
vaga no Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Talvez
Bolsonaro desejasse, com tal atitude, reafirmar a condição de que quem manda é
ele. Mas isso é um detalhe menor. Observe-se o que aconteceu com Dilma
Rousseff, que não costumava desautorizar ministros. Fracassou. Um presidente
demonstra que quem manda é ele quando pensa prioritariamente no sucesso de sua
administração. Um governo sem sucesso não passa para a História. Aliás, passa
sim, mas de forma negativa. Um governo é muito mais do que uma vontade ou uma
birra pessoais.
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