Abraham Weintraub, um segundo ‘olavete’ no MEC para gerir
a “terra arrasada”
Um professor universitário contra
o “marxismo cultural”, que trata seus opositores como inimigos,
especialista em Previdência social, que passou pelo mercado financeiro, mas
nunca gerenciou nada na área educacional. Foi aluno de Olavo de Carvalho – o
ideólogo do bolsonarismo. Esse é o novo ministro da Educação, o economista
Abraham Weintraub. Ao lado de seu irmão, o advogado e professor Arthur
Weintraub, administrou o Centro de Estudos em Seguridade e prega a bandeira
ideológica e conservadora do Governo Jair
Bolsonaro (PSL). Chega ao cargo com o desafio de administrar uma
“terra arrasada” deixada por seu antecessor
Ricardo Vélez. Entre idas e vindas, Vélez demitiu mais de dez
assessores e quatro secretários-executivos, além de não conseguir dar andamento
a quase nenhum projeto em pouco mais de três meses de gestão.
Aos 47 anos de idade, Abraham Weintraub é professor
universitário da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) desde 2014. Dois
de seus colegas consultados pela reportagem disseram que ele teve uma passagem
discreta pela universidade porque parecia se dedicar mais aos seus projetos
pessoais do que à academia. Em 2014, apoiou a campanha presidencial de
Marina Silva (REDE). Antes de abraçar a carreira acadêmica, Abraham
atuou no Banco Votorantim e na Quest Corretora.
A aproximação dos irmãos Weintraub com presidente se iniciou
há quase dois anos, por intermédio de Onyx Lorenzoni (DEM), o ministro da Casa
Civil. Ao mesmo tempo ganhou a confiança do deputado federal Eduardo Bolsonaro
(PSL-SP), o filho mais novo do presidente. Em princípio, Abraham atuaria no
ministério da Economia como um dos responsáveis por elaborar a reforma da
Previdência. Mas o ministro Paulo Guedes preferiu nomear alguém com experiência
legislativa para a função de secretário especial de Previdência e Trabalho.
Afinal, era necessário convencer parlamentares sobre a necessidade de se
aprovar a reforma. Assim, a vaga ficou com o ex-deputado federal Rogério
Marinho (PSDB-RN). Abraham acabou, então, na secretaria executiva da Casa
Civil. Enquanto isso, o irmão dele, Arthur, tornou-se chefe da assessoria
especial da Presidência da República.
Na Cúpula Conservadora das Américas no ano passado, evento
promovido pelo deputado Eduardo, Abraham chamou o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva de sicofanta (mentiroso), disse que o ex-ditador
cubano Fidel Castro era um playboy e que o petismo não estava morto, por isso
teria de ser combatido. “Quando caiu o muro de Berlim, teve um monte de goiaba
que falou: agora o comunismo acabou. Agora, que o Jair Bolsonaro ganhou, tem
muita gente dizendo que o PT está derrotado, que podemos ficar tranquilos. Não,
não podemos”. Ressaltou, ainda, lições de Carvalho, caso seus colegas
professores passassem criticá-los por serem de direita. “A gente adaptou a
teoria do Olavo de Carvalho de como enfrentar eles [comunistas] no debate
intelectual. Não precisa mandar pastar. Quando eles falam, a ciência é
burguesa, então vá embora daqui porque aqui é o templo da ciência, seu religioso”.
Nessa segunda-feira, em entrevista ao jornal O
Estado de S. Paulo, disse que não precisa seguir na íntegra o que o
ideólogo sugere. “Ele tem ideias muito boas, mas não sigo ipsis
litteris tudo o que ele fala. Não é porque gosto de música clássica
que não escute rock and roll de vez em quando”. Dentro do MEC, contudo há a
expectativa do retorno de boa parte dos olavetes que foram demitidos nas
últimas semanas por Ricardo Vélez. Outras declarações do ministro também já
provocam repercussão negativa, como a de que "crack foi introduzido de
caso pensado no Brasil". "Em vez de as universidades do Nordeste
ficarem aí fazendo sociologia, fazendo filosofia no agreste, [devem] fazer
agronomia, em parceria com Israel", disse ele no ano passado, em
uma transmissão ao vivo citada no UOL.
Os desafios na pasta
Entre seus desafios na pasta está a impressão e organização
do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), já que a gráfica que faria o trabalho
declarou falência, e a definição de uma agenda na área de educação básica e a
aproximação de áreas sensíveis, como ciência e tecnologia.
Desde
que Vélez começou a perder força no cargo, há quase duas semanas, uma lista
de nomes foi sugerida ao presidente. Além de Abraham, outros dois corriam por
fora. O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) foi defendido pela bancada evangélica e
o empresário e consultor em educação Stravos Xanthopoylos foi sugerido por
membros do mercado educacional. O que pesou na escolha do presidente foram seus
dois padrinhos Olavo e Onyx. Ambos foram consultados por Bolsonaro e a decisão
anunciada nesta segunda-feira.
A troca foi vista de maneira positiva por apoiadores de
Bolsonaro. “O MEC precisa de um bom gestor e não de um ideólogo do atraso, que
defenda a revolução contramarxista do século XIX”, afirmou o cientista político
Antonio Testa, um antigo colaborador do presidente na área de educação. Segundo
ele, Abraham é um técnico capaz de gerenciar a pasta com o segundo maior
orçamento do Governo, com 115 bilhões de reais.
Outros especialistas, contudo, entendem que a troca não
deverá surtir efeito no Governo. Entendem, por exemplo, que é necessário
empossar alguém com experiência na área educacional. “Todo esse jogo de cena,
trazendo para o MEC pessoas completamente alheias ao sistema educacional tem
como objetivo o desmonte”, afirmou o sociólogo César Callegari, ex-membro do
Conselho Nacional de Educação e presidente do Instituto Brasileiro de
Sociologia Aplicada.
Na opinião de Callegari, o papel de Abraham será o de
defender os planos do ministério da Economia de desvincular a educação do
orçamento da união. Conforme a Constituição,
o Governo federal tem de investir 18% de seu orçamento em educação,
enquanto que as gestões estaduais e municipais são obrigadas a gastar 25%. Uma
proposta de emenda constitucional deverá ser enviada nas próximas semanas
revisando esses percentuais.
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