Fui contra o impeachment da Dilma. Pensava que seria
pedagógico deixar o ciclo da equivocada política econômica, iniciada ainda no
governo Lula, se encerrar. O fracasso da Nova Matriz Econômica nos livraria das
tentações populistas, se não para sempre, por muito tempo. Não estava de todo
errada, porque há muitos que, ignorando a recessão e o desemprego gerados,
ainda advogam por um aumento dos gastos. Mas Temer assumiu e com ele uma equipe
econômica de primeira, que colocou a economia nos trilhos.
Impossível ignorar a importância do interregno do governo
Temer, que iniciou o – longo – processo de recuperação cíclica da economia
brasileira. Imagine onde estaríamos com a passagem direta de um país quebrado
para um governo sem nenhuma experiência em políticas públicas?
A continuidade dos ajustes nas contas públicas e a aprovação
da reforma da Previdência mudaram o humor da economia e, se não nos prometem um
futuro brilhante, mostram uma luz no fim do túnel. Resta torcer para o País
crescer de forma sustentada, acima do normal da economia brasileira, para que
empregos sejam gerados e pobreza e desigualdade reduzidas.
Como só de economia não se faz um país, não podemos fechar
os olhos para o retrocesso civilizatório deste governo. O reformismo econômico,
que se pretende liberal, não compensa a destruição que se vê em importantes
pilares da democracia liberal.
A ousadia destrutiva de Bolsonaro surpreende até os mais
pessimistas. Juntou em torno de si um grupo de exterminadores do futuro. Que
futuro pode ter um país sem educação e cultura; sem história; sem imprensa; com
meio ambiente em risco; sem liberdade de expressão; que elogia torturadores e
ditadores, que ataca nas redes uma senhora de 90 anos, que dedicou sua vida a
este País através de sua arte?
Governos totalitários começam por desmontar a cultura e a
liberdade de expressão. Não querem cidadãos críticos, que pensem, que
perguntem, que duvidem. As fake news devem ser recebidas sem questionamentos.
ONGs que se dedicam à defesa do meio ambiente derramam óleo de seus navios e
tocam fogo na Amazônia financiadas por um ator de Hollywood. O rock é a porta
do satanismo e do aborto, brasileiros são ladrões de mantas em aviões. Caetano
e suas letras estimulam o analfabetismo. As universidades federais são grandes
plantações de maconha e seus laboratórios produzem drogas químicas.
Ao mesmo tempo, há fatos que, se fossem falsas notícias,
seriam ótimos: filmes brasileiros têm seus cartazes retirados do site da
agência de fomento do cinema e no comando da fundação que atua contra o
racismo, um racista. Uma ministra vai a eventos esperando ver mulheres com
crucifixos na vagina, outro trata com naturalidade a possibilidade de um novo
AI-5, e até o general Franco é homenageado com citações a seu lema predileto.
Na cultura, o “tal do Alvim” foi premiado pela agressão que fez à Fernanda
Montenegro e se cercou de um bando de lunáticos. Poderia ser motivo de chacota,
não fosse um movimento racional e planejado para desmontar a cultura neste
País. Não está nada engraçado.
O presidente ri. E seus seguidores tomam essas loucuras como
verdade, reproduzindo os despautérios e mentiras. É uma caça as bruxas, típica
do pré-Iluminismo. Uma alma religiosa e complacente diria: “Perdoai-os Senhor,
eles não sabem o que dizem”. O grave é que sabem e, usando o santo nome em vão,
destilam um ódio e preconceito em nada compatível com qualquer ensinamento
cristão. Está faltando mais papa Francisco, e sobrando o mago de Virgínia, na
vida desses fiéis. Infelizmente, a lista de absurdos é longa e nada indica que
vai parar de crescer.
O extermínio não é exclusividade do governo federal. O Rio
de Janeiro está se desmontando por um misto de má administração e desamor pela
cidade. Crivella é, sem dúvida, o pior prefeito da história, e olha que a
concorrência é grande. Sobre Witzel, deixo o drible que levou de Gabigol falar
por si. Não sei como, no futuro, vou conseguir explicar ao meu neto que do Rio
saíram Crivella, Witzel e Bolsonaro.
A sensação de impotência é grande. Muitos se perguntam como
barrar o avanço do autoritarismo e do obscurantismo. A Justiça impediu a posse
de Sérgio Camargo na Fundação Palmares. É um caso excepcional porque suas
declarações sobre escravidão e racismo são incompatíveis com a missão da
Fundação, diz a sentença, confirmada na segunda instância. Muitos viram a
decisão como uma intervenção indevida do Judiciário no direito da administração
pública de escolher seus executivos. Só o despreparo não é motivo para impedir
a posse de um administrador público. Se essa moda pega, vamos brincar de resta
um.
O voto continua sendo nossa única arma para evitar que o
futuro seja colocado em risco. Três anos parecem uma eternidade, mas as
eleições municipais podem ser o começo da mudança. Hasta la vista, baby.
Feliz Natal!
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