A confusão provocada pela demissão de um assessor do
Gabinete Civil da Presidência da República que utilizou um avião da FAB
inteirinho só para viajar de Davos, na Suíça, para a Índia, revelou a um só tempo
a gestão deficiente do governo e a interferência não profissional dos filhos do
presidente Bolsonaro em assuntos do governo.
O Gabinete Civil da Presidência da República sempre teve
papel de destaque nos diversos governos brasileiros, inclusive durante a
ditadura militar. Em vários casos teve um papel político fundamental; em
outros, transformou-se em centro da gestão do governo.
Na maioria deles, porém, apesar de críticas que possam
merecer, os ocupantes foram personalidades de destaque, políticos de renome,
executivos de qualidade. Isso só não aconteceu em alguns momentos, ou no
governo Collor, que colocou no lugar um diplomata seu cunhado, e agora com
Bolsonaro, que tem, por enquanto, Onyx Lorenzoni.
Getúlio Vargas teve Lourival Fontes, o homem que na ditadura
do Estado Novo havia criado o temível Departamento de Imprensa e Propaganda
(DIP). Juscelino teve intelectuais como Álvaro Lins, Victor Nunes Leal; João
Goulart levou para o Gabinete Civil gente do nível de Hermes Lima, Evandro Lins
e Silva e Darcy Ribeiro.
No regime militar, Castello Branco teve o político e
escritor baiano Luís Viana Filho; Médici, o jurista Leitão de Abreu, Geisel
teve Golbery do Couto e Silva, Figueiredo reconvocou Leitão de Abreu para
substituir Golbery, que saiu no início do governo.
Na redemocratização, Sarney teve José Hugo Castelo Branco,
Marco Maciel, que viria a ser vice de Fernando Henrique, e o historiador
Ronaldo Costa Couto. Itamar teve Henrique Hargreaves. Fernando Henrique teve
Clóvis Carvalho e Pedro Parente.
Lula teve José Dirceu. Dilma teve Antonio Palocci, e tentou
colocar Lula no posto-chave do governo, para resistir ao impeachment que se
avizinhava. Temer teve Eliseu Padilha. A escolha de Onyx Lorenzoni já foi uma
indicação de que a meritocracia no governo Bolsonaro na grande parte das vezes
não tem nada a ver com as qualidades para exercer um cargo, mas com a
recompensa pela lealdade demonstrada.
Estão aí, entre outros, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo
Salles, que também usou um avião da FAB indevidamente, o da Educação, Abraham
Weintraub, que comete erros em cima de erros e fica tudo como está, ou o
ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, cujo laranjal continua intocado, e
ainda ganhou de sobra a Secretaria de Cultura.
O deputado Onyx Lorenzoni, do DEM, nunca foi destacado na
atuação do Congresso, e ganhou uma notoriedade além de sua capacidade política
com a nomeação para o Gabinete Civil. Logo a realidade se impôs, e ele foi
perdendo as funções, primeiro a de coordenar as relações do Palácio do Planalto
com o Congresso, tarefa que passou para a Secretaria de Governo. A Secretaria-
Geral passou a ter a coordenação dos ministérios.
Para compensar Onyx, dos primeiros políticos a apoiá-lo,
Bolsonaro colocou em sua pasta a coordenação do Programa de Parceria de Investimentos
(PPI), que ontem foi retirada, indo para onde sempre deveria ter estado, o
Ministério da Economia. Paulo Guedes passa a ter o controle completo das
privatizações, o que deve dar mais organização ao setor.
O assessor Vicente Santini acabou demitido abruptamente,
mesmo sabendo-se que vários outros ministros usaram o mesmo artifício
indevidamente. Santini, no entanto, é amigo dos filhos de Bolsonaro, que o
convenceram a recolocá-lo em outro cargo no governo.
A nomeação chegou a ser publicada no Diário Oficial, e foi
desfeita poucas horas depois, quando Bolsonaro foi convencido pela repercussão
negativa, e pela ação dos ministros Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança
Institucional (GSI), e Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, que o
aconselharam a voltar atrás.
O presidente tem o defeito de decidir mais com o estômago do
que com a cabeça, o que faz com que se sobressaiam seus recuos, que, em vez de
serem uma qualidade, são consequências de decisões equivocadas
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