Cada época tem a gíria que merece. Gíria aí significando
a linguagem de
um grupo fechado, a qual, a princípio, só fazia sentido dentro dele próprio,
funcionando como código de defesa, mas cuja ação e importância, por algum
motivo, se expande, se multiplica, fura a bolha e faz com que suas histórias,
narrativas, hábitos, atitudes, palavras comecem a ser admirados, imitados e
muitas vezes mal interpretados pela sociedade em geral. O fenômeno vale para
uma patota de amigos da esquina, uma torcida de clube, um bando de marginais ou
um conjunto musical.
A repórter Naira Trindade, no jornal O Globo, mostrou que o
jargão da caserna domina o dia a dia do governo, que tem —além do presidente,
um capitão do Exército aposentado, e do vice, um general da reserva— oito
militares ocupando o alto escalão, alguns deles com gabinete no Palácio do
Planalto.
Donde os civis que ainda estão em Brasília não se espantam
mais em ouvir expressões como “bizu” (conselho), “papirar” (estudar), “estar de
baixa” (estar doente), “arranchar” (comer), “plotar” (descobrir) ou “galho
fraco” (tarefa fácil de cumprir). Qualquer missão dada é missão cumprida,
porque soldado se vira.
Em meus tempos na tropa do Forte de Copacabana (“um ano,
zero mês e 25 dias”, conforme consta na certidão de alistamento), convivi com
essas e outras gírias. Se você trabalhava no rancho, preparando e servindo uma
“Sandra Bréa atropelada” (prato com pedaços de galinha), ficava conhecido como
“pé-de-banha”. Aquele que não aprendia a marchar virava “mocorongo”. “Acerta o
passo, mocorongo” era o grito do sargento durante a ordem unida.
Quem “aloprava” (ou seja, descumpria ordens) estava sujeito
à expulsão. Um exemplo de “aloprado”
é o presidente que conspira com extremistas de direita para derrubar o
Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal.
Alvaro Costa e Silva
Jornalista, atuou como repórter e editor. É autor de
"Dicionário Amoroso do Rio de Janeiro".
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