Está provado e, deveras, reconfirmado: a impulsividade é uma
característica latente do presidente, que toma decisões de acordo com o
sentimento (e a conveniência) da hora. Tome-se o caso da retirada dos
brasileiros de Wuhan, na China, já de retorno para uma quarentena por aqui.
Alegando entraves diplomáticos, custo orçamentário, ameaça de contaminação,
dificuldades jurídicas, o escambau a quatro, Bolsonaro havia dito que não iria
fazê-lo. Determinou que a medida estava fora de cogitação porque, no seu
entender, poderia expor boa parte da população brasileira de maneira
desnecessária. Nas suas palavras: “Não vamos colocar em risco nós aqui (sic)
por algumas famílias apenas”. Voltou atrás no surto de egoísmo e descaso.
Ao ver que os demais países, por dever humanitário e de
solidariedade aos compatriotas, providenciaram a saída de seus cidadãos dos
locais afetados — medida óbvia e inevitável —, o capitão resolveu finalmente
seguir a ordem natural das coisas e repetir o exemplo. Deve ter caído a ficha
sobre o tamanho da insensatez que cometeria lavando as mãos e se eximindo de
responsabilidade no assunto. Afinal, onde iria parar o lema “governar para
todos”, tão decantado em prosa de políticos de sua estirpe? Com a fritura em
fogo brando do ministro Onyx Lorenzoni se deu a mesma coisa. Ele inicialmente
havia resolvido retirar o auxiliar da pasta. Chamou-o para uma conversa nesse
sentido. Pensou em deslocá-lo para outro posto. Depois decidiu mantê-lo onde
está. O secretário Vicenti Santini, também da Casa Civil, virou pivô de mais um
espetáculo de vacilação. Há poucas semanas, o capitão chegou a destituí-lo,
indignado por uma viagem dele em voo da FAB. No dia seguinte voltou atrás e o
readmitiu em outra função, para logo a seguir demiti-lo de novo. Em menos de 24
horas, Santini entrou e saiu do governo três vezes, em um feito inédito de
ordens e contraordens oficiais. Foi assim em inúmeras ocasiões. Nunca se sabe
se o mandatário seguirá firme por uma direção ou por outra, já que ele
demonstra tocar as decisões quase sempre sem rumo certo e com limitado
conhecimento da realidade que o cerca. Em tempos não muito distantes, chegou a
dizer que não havia brasileiro passando fome. Depois…voltou atrás e reconheceu
as evidências em contrário. Na virada de ano, anunciou que iria promover um
reajuste para os policiais. Alertado sobre o custo do agrado, negou logo após.
Em determinada ocasião, comunicou de público que suspeitava ter câncer e, em
seguida, classificou a própria declaração de mentira e sensacionalismo da
imprensa. Havia se superado na negação de si mesmo. O presidente é um adepto
tão fervoroso das fake news que há de se dar a ele o benefício da dúvida quanto
a uma verdade absoluta na cartilha pela qual professa. Desconfie! Nem sempre o
que Bolsonaro diz ou pensa é realmente aquilo que ele acredita ou quer dizer.
Em um comportamento ainda mais complexo, talvez explicável apenas na
psicanálise, rotineiramente ele afirma algo para depois desmentir. É quase um
esporte. Entendeu? Ninguém consegue. Nem dá para aceitar. Os episódios nesse
sentido se multiplicam aos montes. Na gangorra das divagações de Messias,
sequer os venezuelanos escaparam. Bolsonaro, sem prova ou qualquer informação
concreta, logo nas primeiras horas de um vazamento criminoso de óleo contaminar
parte da costa brasileira, atribuiu a responsabilidade aos vizinhos. E falou
isso para quem quisesse ouvir, em entrevista aos jornalistas. Desdisse o que
disse, mais uma vez. Foi se verificar mais tarde que um navio grego estava por
trás do incidente. O ministro da Justiça, Sergio Moro, herói nacional, não
escapou de ser mais uma vítima de sua, digamos, “tática” de idas e vindas.
Receoso do prestígio e da sombra que o auxiliar gerava no seu governo, o
presidente sugeriu a intenção de retirar dele as atribuições da segurança.
Falou isso, jogou a ideia no ar e…voltou atrás. O mesmo quando, logo na estreia
de sua gestão, resolveu extinguir o Ministério do Trabalho. Depois não levou
adiante a medida. O Imposto de Renda? Garantiu que baixaria a alíquota.
Reavaliou e desistiu.
É nessa instabilidade de decisões e na malemolência de
gestão que Bolsonaro fixa seu mandato. Nada do que ele diz é seguro. Bem como
ninguém que ele acusa de traidor — e fez isso diversas vezes, inclusive com aliados
e correligionários – pode ser encarado exatamente como tal. Não se toma ao pé
da letra o que diz e pensa o presidente. Afinal, pode ser só uma reação da
hora. Nessa toada fica a duvida: é possível apostar que esse Messias está
realmente tentando dar prumo e norte ao País? Ou mesmo: como reconhecer quais
as suas reais convicções se elas mudam ao sabor do vento e das circunstâncias?
Bolsonaro diz que não aceita o toma lá, da cá com políticos e abertamente
pratica a habitual distribuição de verbas e até de cargos para fazer valer suas
propostas — muitas delas esdrúxulas, como a do fim dos radares e das
cadeirinhas para transporte de crianças nos carros. Francamente, não é razoável
levar a sério um chefe da nação assim. Ele não pode ser taxado sequer de mercurial.
Sua inconstância não é apenas no humor. Passa disso. Avança perigosamente para
o plano das ações e, dessa forma, compromete ou, no mínimo, desestabiliza os
rumos de um País inteiro. O capitão, que é facilmente influenciável, pelos
bajuladores em especial, e teimoso com os supostos opositores — de quem não
aceita qualquer contribuição, mesmo construtivas e corretas —, mostra-se inábil
na cadeira do Planalto. Em mais de um ano aboletado no poder, não aprendeu e,
pelo visto, demore o tempo que for ali, não vai aprender a ser estadista na
plenitude do conceito. De pulso firme, princípios republicanos e preocupação
com o interesse geral. Bolsonaro age exclusivamente para proteger os seus e
valores retrógrados de perseguição e preconceito contra quem pensa e é
diferente dele. Pobre de uma nação que precisa conviver com um comandante de
valores tão limitados.
Mais do que nunca, o presidente parece precisar urgentemente
de um divã de analista para se tratar e quem sabe assim passar a exibir aos
menos um pouco de equilíbrio nas escolhas e enunciados que faz. Como uma
metralhadora giratória, nos últimos dias ele tratou de disparar mentiras,
acusando indevidamente governadores estaduais pelo preço do combustível (quando
80% dos tributos sobre o produto são federais). Na sua munição de fake news, o
Congresso é alvejado como vilão, acusado pelo “mito” de jogar contra os
interesses nacionais — quando, os fatos demonstram, a Casa assumiu a
responsabilidade direta pelos trabalhos e aprovação, por exemplo, da Reforma da
Previdência, enquanto Bolsonaro mostrava pouco interesse e empenho com o
assunto. Agora o mandatário diz que quer, mas, na verdade, não faz o menor
esforço para ver aprovada a reforma administrativa. Teme que servidores
federais se voltem contra ele e o boicotem nas eleições municipais. Mais uma
vez prevalece o interesse pessoal sobre a necessidade nacional. Governar para
si e para os seus, jamais para maioria, virou marca da gestão bipolar.
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