Em meados de 2017 o índice nacional de homicídios,
ascendente por décadas, principiou a desacelerar e, no ano seguinte,
surpreendentemente, caiu pela primeira vez em cinco anos. Ao final de 2018 a
redução tinha sido de 10%, um feito a comemorar. Em 2019, a tendência se
manteve e a queda foi maior, de 19%, numa redução de 10.000 mortes a menos.
Surgiram então as mais diversas teorias e explicações para
tal queda. Para uns, teria sido a redução dos massacres dentro do sistema
prisional. Para outros, as razões seriam: a ocorrência de mudanças nas
dinâmicas do crime, uma maior articulação entre as polícias, os centros de
operação e inteligência integrados – saldo dos grandes eventos (Copa do Mundo e
Olimpíadas) e, por fim, a mudança demográfica em curso, com a redução de jovens
e adolescentes vulneráveis.
Da minha parte defendi que a queda dos índices fora fruto da
ação dos governos estaduais, face à proximidade das eleições de 2018. Sabiam os
governadores que teriam no julgamento da população sobre a segurança pública um
aspecto chave para o seu sucesso nas eleições. Com a chegada do atual governo
federal ao poder, o discurso de imediato foi o de chamar para si a queda
nacional dos homicídios. Ela seria fruto da transferência de alguns líderes de
facções criminosas de penitenciárias estaduais para unidades federais e de uma
maior atuação da Polícia Federal no combate às drogas etc.
Para nós era evidente, e sem descartar o efeito positivo
dessas medidas, que elas eram insuficientes para justificar uma queda dos homicídios
daquela ordem e em escala nacional. Quando à frente do Ministério da Segurança,
desenvolvemos ações várias, como a coordenação de todas as polícias do país no
combate à pedofilia, ao feminicídio, e homicídios, vinculação de recursos das
loterias ao Fundo Nacional de Segurança, implantação do Pró- Segurança no BNDES
com R$ 40 bilhões, dentre outras. E criamos o Susp, Sistema Único de Segurança
Pública.
Não obstante a contribuição dessas medidas, jamais nos
consideramos protagonistas da queda dos índices. Afinal, são os estados que
cuidam, legal e executivamente, da questão da violência e da segurança pública,
através das polícias, judiciário e ministério público estaduais e não o governo
federal.
Pelos dados divulgados pelo Monitor da Violência, os homicídios
subiram de janeiro de 2020 para cá, 11%, portanto antes do início da pandemia,
sem que tivéssemos mudanças palpáveis nas causas apontados para a queda dos
homicídios registrada anteriormente. E por que caíram, então? Pela razão de que
o fôlego fiscal e a injeção de recursos dos governos estaduais na segurança de
2017/ 2018, esgotou-se, lamentavelmente.
Nesse contexto, urge (i)implantarmos o SUSP e de dotarmos o
pais de um efetiva política e um sistema de segurança pública, que coordene os
esforços da união, dos estados e municípios; (ii) enfrentarmos a crise do nosso
sistema prisional, superlotado e nas mãos das facções criminosas; (iii)
revermos nossa atual política de drogas; (iv) despolitizar, reformar e equipar
materialmente e de recursos humanos qualificados nossas polícias; e (v)
desenvolver um amplo programa nacional de prevenção social focado na juventude
vulnerável.
*Raul Jungmann – ex-deputado federal, foi Ministro do Desenvolvimento Agrário e Ministro Extraordinário de Política Fundiária do governo FHC, Ministro da Defesa e Ministro Extraordinário da Segurança Pública do governo Michel Teme
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