Ao sair de Belém, o chanceler alemão, Friedrich Merz, disse
que a comitiva do seu país ficou contente ao deixar aquele lugar. Foi um deus
nos acuda; do presidente ao Senado, muitos protestos. Volto ao assunto para
propor uma visão mais leve, quem sabe para ser usada numa próxima vez.
Para começar, confesso que gosto de Belém. Passo manhãs
inteiras no Mercado Ver o Peso, deslumbrado com a profusão de cores e aromas
dos produtos da floresta. Frequento o Museu Goeldi e sua área externa com a
velha sumaúma e vitórias-régias. Gosto de comer um peixe chamado filhote, numa
crosta de castanha, com risoto de jambu.
Fiz um curto documentário sobre a música, focado em Nilson
Chaves, e, às vezes, me vejo cantarolando uma de suas canções: O sol da
manhã rasga o céu da Amazônia /Eu olho Belém da janela do hotel.
É tão tranquila minha admiração pela cidade que jamais me
passaria pela cabeça hostilizar alguém com uma opinião oposta. Não sabe o que
está perdendo.
Há muita gente e muitos lugares no mundo. O chanceler
cometeu uma gafe. Há alguns anos, uma revista, creio que foi a Granta, abriu
espaço para uma dezena de escritores descreverem o pior lugar do mundo. Eram
relatos de viagens acidentais; às vezes, uma parada forçada para escala.
Eu mesmo, ao cobrir o fim do império soviético nos países
bálticos, fui bem na Estônia e na Letônia, mas encrenquei com a Lituânia. Era um
momento apenas. Se voltar hoje, creio que descobrirei a beleza do país. No caso
de Belém, deve ter passado o desconforto do calor.
Durante a COP30, o calor para mim era suportável. Mas vivo
no Rio e enfrento sol de rachar nas viagens do Xingu ou mesmo ao Pantanal e ao
Rio Pandeiros, em Januária (MG). Há quem não se importe nem com o calor nem com
os mosquitos. Roosevelt fez uma longa viagem Amazônia adentro. Essa viagem
inspirou uma série dirigida por Bruno Barreto.
Dois escritores europeus vieram morar no Brasil durante a
Segunda Guerra. Stefan Zweig e Georges Bernanos. Escolheram climas amenos
em Petrópolis
(RJ) e Barbacena (MG),
respectivamente. A própria poeta Elizabeth Bishop também morou em Petrópolis
com a mulher, Lota de Macedo Soares.
Orson Welles esteve no Rio algum tempo. Sartre e Simone de
Beauvoir, assim como Camus, fizeram viagens enriquecedoras pelo Brasil. Antoine
de Saint-Exupéry visitou muito Santa Catarina e, quando tiver tempo, contarei
essa história.
O Brasil está tranquilamente inserido no mapa dos lugares
atraentes do mundo. Isso não significa que todos gostarão. Nos filmes B, depois
de um grande assalto, os ladrões sempre sonhavam em fugir para o Brasil.
Chegaram a fazer isso, depois de um assalto ao trem pagador na Inglaterra.
Conhecendo alguns desses detalhes, creio que a gente pode
ter muita calma, como qualquer outro país do mundo. Se um líder sul-americano
dissesse que não gostou de Nova York e
estava feliz por sair daquele lugar, qual seria a repercussão? Quem soubesse do
assunto apenas perguntaria:
— E daí?
Temos tudo para fazer a mesma pergunta ao chanceler alemão.
Quem sabe, numa próxima, perguntaremos “E daí?” e cuidaremos de temas mais
importantes?
Artigo publicado no jornal O Globo em 25 / 11 / 2025


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