Por Edson Sardinha, Congresso em Foco
Em audiência pública realizada na Câmara, o deputado
Leonardo Quintão (PMDB-MG) admitiu uma prática que infringe uma regra pouco
conhecida do Código de Ética da Casa: a que proíbe qualquer parlamentar de
relatar proposta de interesse de empresas que tenham financiado sua campanha
eleitoral. Relator do projeto do Código de Mineração, Quintão contou que
recebeu recursos de mineradoras para sua eleição e que defendia os interesses
do setor no Congresso. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cinco
mineradoras doaram R$ 379,7 mil para a campanha eleitoral do peemedebista em
2010. Por causa dessa ajuda, ambientalistas entraram nesta semana com
representação na Câmara contra o deputado por quebra de decoro parlamentar.
Na presença de integrantes e convidados da Comissão de Meio
Ambiente, em dezembro do ano passado, Quintão disse não ver nenhum conflito de
interesse entre a doação e a relatoria do projeto. A declaração foi registrada
em vídeo, divulgado esta semana na internet por ambientalistas. “Sou financiado,
sim, pela mineração, legalmente. Alguns ambientalistas dizem: ‘você não pode
ser relator porque é financiado pela mineração’. De forma alguma”, disse
Quintão. “Não tenho nenhuma vergonha de ser financiado, dentro da lei, por
mineradoras. Nosso projeto impede e inibe toda e qualquer especulação no setor
mineral”, continua. “Eu defendo, sim, o setor mineral, respeitando as leis
brasileiras”, acrescentou (veja trecho ou a gravação na íntegra, a partir de 1:29:07).
Representação inédita
De acordo com o inciso VIII do Art. 5º do Código de Ética da
Câmara, fere o decoro parlamentar “relatar matéria submetida à apreciação da
Câmara dos Deputados, de interesse específico de pessoa física ou jurídica que
tenha contribuído para o financiamento de sua campanha eleitoral”.
O deputado virou alvo de uma representação inédita esta
semana. Pela primeira vez, um parlamentar foi denunciado formalmente por
relatar projeto que interessa a setor que financiou sua campanha. Pelo Código
de Ética, a punição prevista para esse caso é a suspensão do direito de relatar
qualquer proposição por determinado período, a ser determinado pelo Conselho de
Ética. Procurada pelo Congresso em Foco, a assessoria de Leonardo Quintão
informou que o deputado prefere não comentar o assunto.
Mas em entrevista à Agência Câmara, o deputado negou
defender os interesses das mineradoras. Segundo ele, seu parecer foi contrário
às empresas, pois aumenta de 2% para 4% sobre o faturamento líquido o valor a
ser pago como royalties pelas empresas. Ambientalistas, no entanto, acusam o
deputado de defender de “forma irredutível” os interesses das grandes
mineradoras em prejuízo de populações indígenas e quilombolas.
De acordo com dados registrados no TSE, 20% dos R$ 2 milhões
levantados pela campanha do deputado, em 2010, tiveram como origem doações da
Acerlormittal, da Gerdau, da Usiminas, da Ecosteel e da LGA, empresas que atuam
na área da mineração.
Prática perniciosa
Responsável pela representação, o advogado Raul do Valle, do
Instituto Socioambiental (Isa), diz que o objetivo da denúncia é destituir
Leonardo Quintão da relatoria do Código de Mineração e suscitar uma discussão
aprofundada sobre a prática de parlamentares defenderem, no Congresso,
interesses de setores que bancaram suas campanhas.
“Queremos abrir um precedente dentro da Câmara que possa
moralizar a atuação do parlamentar frente os seus financiadores de campanha. Se
nesse caso, tão óbvio e objetivo, a Câmara não tomar a decisão de retirá-lo da
relatoria, que sirva de alerta para que casos equivalentes sejam revistos. É
preciso acabar com essa prática perniciosa”, afirma.
Caberá ao presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves
(PMDB-RN), dar prosseguimento ou não à representação. Caso Henrique dê
andamento, o caso será enviado ao corregedor, deputado Átila Lins (PSD-AM), que
recomendará ou não à Mesa Diretora que envie o processo ao Conselho de Ética
para a abertura do processo disciplinar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário