Editorial, O Estado de S.Paulo
A abertura da fase final do julgamento do impeachment da
presidente Dilma Rousseff deixou clara a estratégia que o lulopetismo adotou
para tentar sobreviver politicamente. Não se trata mais de defender a presidente
afastada das acusações que certamente lhe custarão o mandato, o que implicará
para o PT o fim melancólico de um ciclo de poder de mais de 13 anos que
culminou com a destruição do País. Isso ficou claro na reunião da Executiva que
rejeitou por 14 votos a 2 a esdrúxula tese de Dilma de convocação de um
plebiscito e antecipação de eleições. Daqui para a frente, como ficou
demonstrado na sessão de ontem no Senado, o lulopetismo vai partir abertamente
para a contestação da legitimidade dos poderes constituídos, renegando o
sistema democrático que a duras penas vem sendo construído pelos brasileiros há
mais de 30 anos, com base no argumento de que Dilma Rousseff é vítima – e,
consequentemente, também o Partido dos Trabalhadores – de uma violência cometida
por “eles”, os inimigos do povo.
“Este Senado não tem moral para julgar a presidenta Dilma
Rousseff”, provocou aos berros a senadora petista Gleisi Hoffmann no plenário,
causando um tumulto que obrigou o ministro Ricardo Lewandowski a suspender a
sessão até que os ânimos serenassem. Foi o lance mais espetacular de um roteiro
preestabelecido pelos lulopetistas e cumprido à risca: a reapresentação de
cerca de uma dezena de questões de ordem indeferidas em fases anteriores do
julgamento, que não eram mais do que pretexto para discursos contra o “golpe”,
todas elas obviamente mais uma vez indeferidas por Lewandowski.
O comportamento dos lulopetistas demonstrou um deliberado
desrespeito às normas do julgamento do impeachment definidas pelas lideranças
partidárias de comum acordo com o ministro Lewandowski. Houve duas tentativas
de procrastinar o julgamento. Não se tratava apenas de ganhar tempo e de abusar
da paciência dos brasileiros ansiosos por ver encerrado esse lamentável
episódio da história da República. A tropa de choque do PT valia-se da
transmissão por rádio e televisão da sessão do Senado para promover a
“narrativa política” lulopetista, como declarou, com todas as letras, o senador
Lindbergh Farias (PT-RJ).
A propagação de sua “narrativa” é um direito elementar de
qualquer partido ou organização política. Mas o sistema democrático impõe a
obediência à lei e o respeito ético aos acordos políticos. E os petistas e
aliados infringiram ostensivamente os regulamentos que deveriam disciplinar a
sessão de abertura do julgamento do impeachment. Essa bem planejada rebeldia
pode até servir eleitoralmente para alguns deles, mas o que faz mesmo é
comprometer negativamente, ainda mais, a imagem pública de uma instituição
democrática fundamental como o Poder Legislativo.
Assim, o comportamento dos senadores que tentaram tumultuar
a sessão mostra que o discurso da defesa não vai se limitar, até o final do
julgamento, a demonstrar que Dilma é vítima dos inimigos das causas populares.
Estará desenvolvendo e afinando um discurso de vitimização do PT que será o
argumento central da tentativa de ressurreição política do lulopetismo.
O detalhe relevante dessa estratégia é que sua viabilidade
depende de que o mandato presidencial de Dilma Rousseff seja efetivamente
cassado. Dilma é a vítima-símbolo. Deverá, portanto, ser imolada no altar das
causas populares para que possa ser usada como bandeira de luta por Lula e seus
seguidores. É uma perspectiva muito mais atraente do que ter que arcar com o
ônus de sofrer com a incompetência de Dilma por mais dois anos e pouco. Em
português claro: o PT quer, precisa que Dilma Rousseff seja cassada. É uma
questão de sobrevivência. Tudo o mais é pura hipocrisia, pois o partido não se
dispõe nem mesmo a convalidar o argumento político mais forte que a presidente
afastada conseguiu apresentar na tentativa de conquistar votos dos senadores
para salvá-la do impeachment: o tal plebiscito para a antecipação das eleições
presidenciais.
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