Os anos 2010 se vão sem deixar saudades. O PIB per capita
cresceu tímidos 0,5% ao ano – muito pouco para um País onde 60% dos
trabalhadores ganham até 1 salário mínimo –, em meio ao aumento da pobreza e à
piora da distribuição de renda.
As medidas demasiadas e equivocadas de estímulo já davam
sinais de exaustão em 2010, pela inflação teimosa acima da meta e pela rápida
deterioração das contas externas. Ajustes eram necessários para que a fartura
não virasse indigestão. Além disso, a expectativa era de o País avançar nas
reformas estruturais pró-crescimento. O que se assistiu, no entanto, foram
retrocessos. Prometeu-se muito e entregou-se uma grave crise.
Dilma preferiu ignorar os “sinais vitais” da economia e
dobrou irresponsavelmente a aposta, em meio a muito intervencionismo estatal e
ingerência em órgãos e empresas públicas. Para citar alguns dos equívocos, os
bancos públicos, menos eficientes e sujeitos a pressão política, tornaram-se
mais importantes na concessão de crédito do que os bancos privados e políticas
setoriais equivocadas foram feitas aos montes. Os resultados foram investimentos
economicamente inviáveis e a rápida deterioração das contas públicas, mascarada
por truques contábeis.
Ciclos econômicos são praticamente inevitáveis. O que
distinguiu os anos 2010 foi a profundidade da crise, em uma obra escrita a
várias mãos: omissões de instituições democráticas; falhas de instituições de
controle que permitiram o desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal; e
complacência e oportunismo de boa parcela do setor privado, com muitos
segmentos se beneficiando das benesses e aproveitando o espaço para pedir mais.
Não à toa a bronca da sociedade é generalizada.
Entristece o Brasil ter ido tão longe na trajetória rumo ao
abismo.
O basta da sociedade levou ao impeachment de Dilma. Um
governo que quebrou o País, e não sabia e não tinha apoio político para
consertar. Quando tentou, no início do segundo mandato, o fez de afogadilho,
sem avançar em reformas estruturais. Com as dúvidas em relação à solvência do
País, refletidas na perda do grau de investimento, a crise ganhou contornos
mais dramáticos, com o aperto do crédito.
A pressão nas ruas começou em 2013. Surpreendeu pelo
ativismo inesperado da sociedade, pois motivos havia de sobra. Vale
compartilhar uma experiência pessoal. Em um seminário internacional, em janeiro
de 2013, alertei a plateia sobre os riscos de retrocessos sociais no Brasil,
pois os econômicos já eram claros, apesar da negação de muitos. A reação do
moderador francês foi afirmar que haveria protestos no Brasil. Eu desconfiei do
alerta. Estava, felizmente, errada. A inquietação da sociedade foi gatilho para
mudanças.
A sociedade rechaçou o modelo econômico de Dilma e, mesmo
com baixíssima popularidade, Temer silenciou as ruas. O governo Temer foi a
grande surpresa positiva desses anos 2010. Houve equívocos, como o de reajustar
o salário de servidores públicos, mas o saldo final foi muito positivo. Com
plano estruturado, entregou um País muito melhor do que recebeu e plantou
sementes para a volta do crescimento. Mudou o debate econômico no Brasil, a
ponto de Jair Bolsonaro rever seus preconceitos e apoiar a reforma da
Previdência que até então sempre criticara.
A classe política passou a compreender melhor a necessidade
de reformas e o País se surpreendeu com um Congresso disposto a fazer reformas
estruturais. Não é só isso. A sociedade cansada tem conseguido tirar os
políticos da zona de conforto.
Não sabemos, porém, quão ambiciosos seremos; quando
conquistaremos maior crescimento sustentado. Será que vivemos uma correção de
rumos efêmera, fruto da falta de recursos, ou estamos mudando nossas crenças?
A julgar pelo nosso passado, o risco a ser combatido é a
complacência. Nos momentos de recuperação da economia desistimos das reformas.
Esperemos que seja diferente nos anos 2020.
*Economista-chefe da XP Investimentos
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