Três semanas depois de registrar a primeira morte pelo
coronavírus, o Brasil ultrapassou a marca das cem em um único dia. O recorde
desta terça marca uma nova fase na epidemia. Daqui para a frente, o país deverá
enfrentar uma forte escalada no número de vítimas da Covid-19.
“Ainda estamos no início da ascensão da curva epidêmica. Nos
próximos dias, ela vai se acelerar de forma contundente”, prevê o
epidemiologista Roberto Medronho, da UFRJ. “Agora entramos numa subida contínua
até o pico da epidemia. E depois a descida ainda será lenta”, adverte.
Para o professor, o pico dos casos ocorrerá entre a última
semana de abril e a primeira semana de maio. “Na velocidade atual, essa
escalada levará ao colapso do sistema de saúde”, avisa.
Ontem Medronho estava mais pessimista. O motivo era o último
Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde, que indicou um afrouxamento nas
medidas de isolamento social. O documento saiu na segunda-feira, quando o
ministro Luiz Henrique Mandetta chegou a arrumar as gavetas para deixar o
cargo.
A linguagem usada no texto sugere um recuo negociado com o
Planalto. Depois de resistir às pressões de Jair Bolsonaro pelo fim das
restrições, a pasta passou a acenar com uma “transição para distanciamento
social seletivo”.
“Vejo isso com muita apreensão. Na prática, parece um
eufemismo para o tal isolamento vertical defendido pelo presidente”, critica o
professor Medronho. “O afrouxamento das medidas fará com que a curva de
contágio se acelere. Quem propunha isso mudou de ideia e hoje está na UTI”,
afirma, referindo-se ao primeiro-ministro britânico Boris Johnson.
O epidemiologista traça um cenário sombrio caso o Brasil
baixe a guarda contra o vírus. “Tudo o que não queremos é ver caminhões do
Exército levando corpos para outras cidades por falta de vaga nos cemitérios.
Isso ocorreu na Lombardia, a região mais rica de um país de primeiro mundo”,
lembra.
Para Medronho, é preciso escapar da falsa escolha entre a
economia e a saúde. “Se não mantivermos o isolamento rígido, a crise vai se
aprofundar mais adiante. A prioridade agora é salvar vidas”, afirma.
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