sábado, 6 de junho de 2020

VELHA POLÍTICA

Adriana Fernandes, O Estado de S.Paulo

A queda relâmpago de Alexandre Borges Cabral, o indicado pelo Centrão para a presidência do Banco do Nordeste (BNB), mostrou falhas e atropelos no ritual de checagem dos nomes apresentados pelas lideranças dos novos aliados do presidente Jair Bolsonaro no Congresso. O “sistema de informação” do presidente não funcionou bem.

Não foi uma boa estreia para a “nova-velha” política de coalizão que Bolsonaro busca com o casamento com as lideranças do Centrão que, aliás, já deu resultados em votações importantes para o governo nas últimas semanas.

Cabral caiu menos de 24 horas após sua posse, no rastro da revelação pelo Estadão de que era alvo de uma apuração conduzida pelo Tribunal de Contas da União (TCU) sobre suspeitas de irregularidades em contratações feitas pela Casa da Moeda durante sua gestão à frente da estatal, em 2018. O prejuízo é estimado em R$ 2,2 bilhões.

A indicação acabou não passando pelas checagens que costumam ser feitas pela Secretaria de Governo do Palácio do Planalto, que podem vetar a indicação. Com isso, não houve o alerta interno das investigações em curso contra Cabral no TCU, o que gerou a decisão de sua exoneração.

A queda foi rápida; porém, nada tem a ver com algum tipo de resistência do ministro da Economia, Paulo Guedes, em ceder cargos do seu vasto ministério, com cinco bancos públicos e outras tantas estatais.

A porteira foi aberta com a presidência do BNB e vai continuar com novas indicações. O loteamento do Centrão avançará em cargos nas estatais e ministérios. Serão muitas indicações nas próximas semanas, já falam abertamente integrantes da área econômica.

É o preço a pagar não só para impedir o impeachment e garantir a governabilidade do presidente Bolsonaro. Trata-se de uma questão de sobrevivência de Guedes no cargo. O seu futuro e da sua equipe estão umbilicalmente atrelados ao apoio do Centrão, que por ora se mostra totalmente alinhado com a ala militar desenvolvimentista do governo.

Pontes de diálogo foram lançadas pelo ministro. A travessia passa pela oferta de cargos e mudanças de políticas. Detalhe: não se ouviu nenhuma reclamação pública de algum líder do Centrão sobre a saída do novo presidente do BNB. Também ninguém se apresentou como padrinho do presidente demitido. Silêncio total.

Com o País quebrado pelo estrago da covid-19, Guedes precisa de votações rápidas para “salvar” a sua política e agilizar a retomada da economia. Com o Centrão em oposição, perde a parada. O ministro já teve um aperitivo ruim na frustrada tentativa de aprovar os seus projetos depois da votação da reforma da Previdência. Nada andou e a retomada da economia entrou cambaleante em 2020 até ser ferida de morte pelo novo coronavírus.

O ministro tem pouco tempo para mostrar os resultados da sua política após a economia entrar numa fase de maior normalidade pós-covid. Os números crescentes de contaminação e mortes mostram que vai demorar mais. Seria impossível aprovar as medidas com uma base de apoio de vinte e poucos parlamentares e um punhado de simpatizantes.

A aprovação da reforma da Previdência foi suada, com uma negociação no varejão que custou caro. Para avançar nas novas pautas, o ministro terá de fazer concessões. Elas já começaram e podem passar, inclusive, pela flexibilização da regra do teto de gastos. É proibido se surpreender com a capacidade política de mudar as narrativas. O retorno da velha para a nova política é a prova desse pragmatismo.

A porteira das suas estatais é só a face mais visível do que está sendo negociado, como também foi o fim do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), que tanto prejuízo trará no futuro para a fiscalização da Receita e arrecadação do governo.

Como Guedes comanda um superministério e detém muitos poderes, tem muito a oferecer. O mercado financeiro já viu que a área econômica pode ganhar mais com a nova aliança. A resposta tem sido uma melhora consistente dos indicadores. Não só pelo otimismo vindo de fora do País. Os investidores estão se antecipando aos efeitos positivos que essa aliança com o Centrão pode garantir nas votações. Sem medo do Centrão apelidado de gastador.

Guedes quer preservar BNDES, Caixa e Banco do Brasil do loteamento político. O tempo dirá se vai conseguir.

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