O presidente Bolsonaro deu mais uma demonstração nos últimos
dias de que não tem noção do que seja ser o líder de um país que tem
importância por sua posição geopolítica, mais do que pela capacidade econômica,
que tem sido pífia na ultima década, que já pode ser considerada perdida, como
a de 1980.
O Brasil, segundo projeções do Fundo Monetário Internacional
(FMI), crescerá 1% ao ano nesta década. De um país que era visto como o futuro
da economia mundial, junto com Rússia, Índia e China (Brics), o Brasil perdeu
quase a metade de sua participação no PIB mundial nos últimos 20 anos. Em 1980,
representava 4,3% e nesta década passará a menos de 2,5%.
Se as previsões de crescimento feitas pela Goldman Sachs se
realizassem, o Brasil teria liderança não apenas na América do Sul, mas na América
Latina como um todo. Sua torcida pela vitória do presidente Donald Trump nos
Estados Unidos foi uma jogada política amadora, mesmo que tenha dado certo, o
que parecia improvável no momento em que escrevia a coluna.
Transformar-se em um seguidor cego do líder da maior
potência atual, por questões ideológicas, não agrega nenhum valor a seu apoio
e, portanto, o desprestigia. Bolsonaro justifica seu apoio a Trump com o perigo
do comunismo voltando à América do Sul com as vitórias na Argentina e na Bolívia,
e a nova Constituição no Chile.
Trata-se de uma análise completamente equivocada, típica de
um governo que vê comunistas embaixo da cama, como nos anos 50 e 60. Também a
direita votou a favor de uma nova Constituição no Chile, pois mais do que se
livrar de um resquício da ditadura militar, há a aspiração da grande classe
média chilena de ter garantias sociais.
Também Trump acusa Joe Biden de comunista, e pode ter
ganhado votos preciosos na Flórida, onde latinos desprezados pelo governo Trump
preferem votar nele com receio do socialismo do qual fugiram em Cuba. Uma
situação completamente surreal, mas que tem efeitos na realidade do dia a dia.
O presidente Bolsonaro considera que apostar suas fichas em
Trump no momento em que ele estava em baixa valerá o agradecimento do
presidente reeleito dos Estados Unidos. Como somos periféricos, estaremos
sempre longe do interesse imediato dos Estados Unidos, sendo difícil que esse
alinhamento incondicional leve a alguma vantagem concreta para o governo
brasileiro.
A não ser nas questões sociais, onde o Brasil tem o apoio
dos Estados Unidos em votações polêmicas na ONU. Uma vitória de Biden nos
isolará mais ainda, nos colocando ao lado de governos conservadores, ditaduras
africanas e do Oriente Médio, que hoje já são nossas parceiras na ONU em
questões sociais delicadas como aborto e família, e em posições que nos colocam
em oposição aos valores ocidentais como questões religiosas e relações com
minorias.
A política ambiental brasileira só se mantém devido ao
comportamento dos Estados Unidos em relação ao tema, que tem no abandono do
Acordo de Paris o maior exemplo. Bolsonaro tentou imitá-lo, mas logo descobriu
que não temos força política para arrostar tamanha afronta ao Ocidente. Mas
mantém sempre a ameaça de sair a qualquer momento.
Com uma vitória de Biden esse apoio desaparecerá e,
provavelmente, surgirá no lugar a possibilidade de sanções internacionais
devido principalmente ao desmatamento da Amazônia e às queimadas. Os americanos
se unirão novamente à Europa para uma política ambiental mais voltada para as
energias renováveis, o que seria bom para o Brasil que tem amplas condições de
explorar energia eólica, solar, biomassas e biogás. Além, claro, da
hidrelétrica, que representa 63,8% da nossa matriz.
Teríamos todas as condições de nos juntarmos, como
historicamente fizemos, a um esforço internacional de redução da emissão de
carbono, não fosse a visão economicista do governo Bolsonaro em relação à
Amazônia e ao Meio-Ambiente de maneira geral. Em vez de uma exploração racional
das nossas riquezas na região, defendida em retórica pelo presidente Bolsonaro,
o governo vai “passando a boiada” relaxando as normas de controle que impedem a
exploração predatória da região.
Apostando na permanência de Trump, Bolsonaro aposta no atraso, o que combina com a defesa de seus interesses, não os do Brasil.
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