Lula e ministros usam evento institucional para
polarização com Tarcísio em momento desfavorável para o petista nas pesquisas
Lula deveria ser o último a querer subir tão cedo no
palanque de 2026, mas o vício do cachimbo entorta a boca, e parece que, quanto
mais as pesquisas se deterioram, mais o presidente parece ansioso para mostrar
que ainda é “o cara”. O resultado, no entanto, tem sido o oposto.
A transformação do evento de assinatura do edital de
construção do túnel imerso que ligará Santos ao Guarujá — obra que a Baixada
Santista espera há cem anos — poderia ser um ótimo exemplo de relação
republicana entre União e governo de São Paulo, funcionando como saudável
contraponto à absoluta falta de institucionalidade com que Jair Bolsonaro
tratava governadores de oposição.
Essa, inclusive, foi a forma inteligente com que Lula agiu
noutros eventos com Tarcísio. O presidente também acertou o tom ao denunciar
ocasiões em que outros bolsonaristas, como Romeu Zema ou Cláudio Castro,
deixaram de comparecer a eventos com o governo federal por questões
político-partidárias.
Mas nesta quinta-feira o script desandou.
Ao fazerem questão de constranger Tarcísio com menções explícitas ou veladas à
denúncia contra Jair Bolsonaro, Lula e o ministro da Casa Civil, Rui Costa,
trataram de marcar um “x” na testa do governador, reconhecendo que ele pode ser
o adversário do petista em 2026. Que vantagem levam com isso?
Manter viva a polarização tem sido o tal vício pelo cachimbo
para Lula desde que assumiu. Pode ser eficaz quando as pesquisas são
favoráveis, e quando o outro lado está em baixa, como nos meses subsequentes ao
8 de Janeiro. Mas, mesmo diante da gravíssima denúncia contra Bolsonaro e da
enorme probabilidade de que ele seja condenado e preso, os levantamentos de
avaliação de governo são favoráveis aos nomes de oposição, como o próprio
Tarcísio e outros que pensam em se aventurar na disputa no ano que vem.
Armar o palanque antes de saber com quem poderá contar, e
com os números trazendo notícias perturbadoras para si em todos as regiões,
estratos de renda e escolaridade, é uma atitude temerária. O presidente chamou
Tarcísio para uma espécie de duelo numa cidade francamente bolsonarista, no dia
em que a pesquisa Quaest apontou que o afilhado de Bolsonaro é aprovado por 61%
do estado e rejeitado por 28%.
Na véspera, o mesmo instituto apontara 69% de rejeição para
o petista entre os paulistas, ante apoio de 29%. Tarcísio obteve pouco mais de
56% dos votos válidos em Santos em 2022, percentual idêntico ao de Bolsonaro.
Lula, pouco menos de 44%. No Guarujá os índices foram semelhantes, assim como
em toda a Baixada Santista.
Ao lotar o evento que deveria ser institucional com uma
claque que vaiou Tarcísio e entoou o grito de “sem anistia”, o presidente
acredita que estava medindo forças com o governador e levando a melhor? Como
seria a reação do público se o palanque fosse montado numa das cidades que
serão interligadas pelo túnel, sem triagem prévia.
Mais: no palanque precoce estavam nomes como Silvio Costa
Filho, cotado para a Articulação Política, e o presidente da Câmara, Hugo
Motta, ambos do partido de Tarcísio, que Lula deveria procurar fidelizar a seu
time com mais sutileza, sem tanto constrangimento público.
Ao atiçar Tarcísio para uma disputa que ele ainda hesita em
topar, o presidente ajuda a oposição, que quer se desvencilhar do embargo que
Bolsonaro impõe à própria sucessão. Uma direita dividida e interditada por um
Bolsonaro desesperado é um dos poucos trunfos de que Lula dispõe num momento em
que, de Norte a Sul, sua gestão não engrena nem consegue convencer o eleitor.
Com esse tipo de erro primário, Lula, que sempre foi
reconhecido como um arguto animal político, dá sinais de cansaço e de falta de
foco para buscar a recuperação de que necessita para chegar viável a 2026.
Nenhum comentário:
Postar um comentário