Do Congresso em Foco
Na noite do último 17 de abril, o primeiro palhaço eleito deputado federal no país estreou no microfone. “Senhor presidente, pelo meu país, meu voto é sim”, disse, em tom seguro e sem gracejos, o deputado Tiririca (PR-SP) ao ser chamado por Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para declarar seu voto – o 197º a favor da abertura do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT). O parlamentar foi saudado com festa pelos colegas. Aqueles cinco segundos são os únicos, até o momento, em que a voz de Tiririca foi captada pelo sistema de som da Câmara em seus seis anos de mandato. Eleito pela primeira vez em 2010 com a segunda maior votação da história à época (mais de 1,3 milhão de votos), o deputado paulista é responsável por dois feitos: jamais falta às sessões mas também nunca discursa.
As duas marcas são raras no Parlamento brasileiro. Grande parte dos parlamentares disputa o horário nobre do plenário para fazer pronunciamentos. É o momento de garantir espaço nos órgãos oficiais da Casa, como a TV Câmara, e no programa “A voz do Brasil”, canais que dão visibilidade às ações políticas de deputados e senadores em suas bases eleitorais.
A assiduidade em 100% das sessões reservadas a votação, aquelas em que a presença é obrigatória, é coisa para pouquíssimos. Além de Tiririca, apenas os deputados Lincoln Portela (PR-MG) e Manato (SD-ES) não tiveram falta nos últimos seis anos, período em que foram realizadas 612 reuniões em plenário convocadas para analisar projetos, medidas provisórias ou propostas de emenda à Constituição. Os dados são de levantamento do Congresso em Foco.
Nas principais votações de 2016, Tiririca votou “sim”. Ele se manifestou a favor do impeachment de Dilma, da cassação de Eduardo Cunha, do teto para os gastos públicos, da reforma do ensino médio e do pacote de combate à corrupção, com a emenda que prevê o enquadramento de magistrados, promotores e procuradores entre as figuras públicas passíveis de responder por abuso de autoridade.
Produção legislativa
Na Câmara desde fevereiro de 2011, Tiririca apresentou 14 projetos de lei, dois deles assinados em conjunto com colegas. Entre as propostas sugeridas por ele, seis pretendem assegurar direitos à comunidade circense, na qual ele começou sua carreira artística ainda criança. O deputado é titular da Comissão de Cultura, onde é um dos mais assíduos também. Faltou a apenas 3 das 24 reuniões realizadas pelo colegiado em 2016.
Uma das proposições de Tiririca determina o reconhecimento do circo como manifestação cultural para que a categoria possa ser beneficiada com os incentivos fiscais da Lei Rouanet (PL 5095/2013). Ele também propõe a inclusão do trailer e do motor home utilizados por artistas de circo como moradia no programa “Minha Casa, Minha Vida” (PL 5094/2013).
Em outros dois projetos, Tiririca sugere a isenção do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) para veículos usados em atividade circense (PL 3544/2012) e mudança na legislação para garantir aos filhos de artistas de circo, na faixa etária de 4 a 17 anos, cuja atividade seja itinerante, vaga nas escolas pública ou particulares (PL 1528/2011). Entre as propostas não voltadas ao circo, Tiririca defende mudança na legislação para impedir a substituição de candidatos inelegíveis com base na Lei da Ficha Limpa. A prática tem sido recorrente nas eleições e, muitas vezes, o candidato barrado é substituído por parentes e, assim, a família acaba conquistando a vaga.
Em seis anos, o deputado relatou 15 projetos. Alguns deles batizam vias e viadutos. Um chegou a virar lei (13.244/2016), o que confere ao município de Caçapava (SP) o título de Capital Nacional do Antigomobilismo, de autoria da ex-deputada Aline Corrêa (PP-SP). Outra proposta relatada por ele institui o Dia Nacional do Condutor de Ambulância.
Verba indenizatória
Embora esteja entre os mais assíduos, Tiririca não está entre os mais gastadores. O deputado utilizou R$ 304,7 mil da verba a que tem direito para ressarcir despesas atribuídas ao mandato desde o início da atual legislatura, no começo de 2014. Entre os 613 deputados que exerceram o mandato em algum momento de lá para cá, 511 gastaram mais que ele. Do total, R$ 240 mil foram consumidos com passagens aéreas, entre Brasília e São Paulo. O restante foi gasto com combustível, aluguel de carro, telefonia, alimentação e manutenção de escritório. A verba indenizatória faz parte da Cota de Apoio à Atividade Parlamentar (Ceap) e seu valor varia de R$ 30.416,80 a R$ 45.240,67, dependendo da unidade federativa do parlamentar.
Considerado um fenômeno eleitoral em 2010, quando recebeu 1.353.766 votos, Tiririca foi o segundo mais votado na atual legislatura, ao ser reeleito com 1.016.796 votos – atrás apenas de Celso Russomanno (PRB-SP), que teve o apoio de mais de 1,5 milhão de eleitores. Em quatro anos, Tiririca perdeu quase 25% da votação. “Em 2010 ganhei por voto de protesto e 2014 por voto consciente e o povo votou porque eu fiz valer o voto! mostrei o que um deputado faz! Obrigado, São Paulo! Vocês são uns meninos lindos!”, justificou ao ser reeleito.
Tiririca teve dificuldade para assumir na Câmara. Acusado por um promotor eleitoral de ter omitido a informação de que era analfabeto, teve de fazer um teste para comprovar que sabia ler e escrever (condição obrigatória para alguém disputar um cargo eletivo no país). O caso só foi arquivado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em novembro de 2013, penúltimo ano de seu primeiro mandato. Os ministros da corte máxima do Judiciário brasileiro concluíram que ele tem “rudimentares conhecimentos de escrita e leitura” e que cassar seu registro seria uma decisão discriminatória.
Durante suas duas campanhas, Tiririca fez graça no horário eleitoral gratuito. “Você sabe o que faz um deputado federal? Eu também não. Vote em mim que eu te conto”, brincava o palhaço em sua primeira eleição. “Trabalha muito e produz pouco”, disse ele em seu primeiro ano de Casa ao Congresso em Foco.
Na eleição passada, Roberto e Erasmo Carlos entraram com processo para impedir a exibição de um vídeo no horário eleitoral em que Tiririca, caracterizado como o “rei”, faz paródia da música “O portão”, sugerindo que o cantor votou nele em 2010. “Eu votei. De novo eu vou votar. Tiririca, Brasília é o seu lugar”, dizia a letra alterada da música. Em março do ano passado, um juiz da 21ª Vara Cível de São Paulo condenou o deputado e o PR a pagarem uma indenização por danos materiais à EMI Songs, dona dos direitos da composição. Na ocasião, o advogado do parlamentar anunciou que recorreria da decisão.
O Congresso em Foco tentou ouvir Tiririca, mas ninguém atendeu em seu gabinete nos últimos dois dias. Os parlamentares estão em recesso e só voltam às atividades no início de fevereiro.
A paródia de Tiririca que rendeu condenação.
sábado, 31 de dezembro de 2016
FELIZ ANO NOVO
Caros leitores, amigos e parceiros mais um ano termina. 2016
foi um ano de muitas conquistas para o blog Sou Chocolate e Não Desisto,
resultado de muito trabalho nesses 11 anos de existência.
A cada ano, ganhamos mais repercussão na internet, entre
blogs e sites que reproduzem nossas postagens. Nas redes sociais como Facebook,
Twitter e Instagram, o Blog tem se destacado.
À todos os leitores, amigos e parceiros, muito obrigado!
Desejo um Ano Novo de realizações, muito amor, paz e esperança. Feliz 2017.
Abraço, Valério Sobral.
Em 2017, o blog Sou Chocolate e Não Desisto completa 12 anos.
Vem novidades aí!
ADEUS, CHEFE !
Eleitores e simpatizantes do prefeito de São Paulo, Fernando
Haddad (PT), foram à sede da Prefeitura, no centro da cidade, participar de uma
despedida improvisada da gestão na manhã desta sexta-feira, 30. Com cartazes de
“Valeu, Haddad”, o prefeito foi saudado pelos correligionários e teve de
enfrentar uma maratona de selfies com os que estavam presentes.
No próximo domingo, 1º, o prefeito eleito, João Doria
(PSDB), toma posse e passa a ocupar o gabinete localizado nas imediações do
Viaduto do Chá. Pelo Facebook, Haddad postou um texto intitulado “Foi um
privilégio governar com vocês” em que reafirma ter deixado “um legado
importante para as gerações futuras”.
“É evidente que não deu pra fazer tudo que gostaríamos. Mas
foram muitas as realizações nos quatro cantos da cidade, sobretudo na
periferia. Fizemos o que precisava ser feito. Sem cálculo eleitoral, sem
demagogia ou pirotecnia. Nunca acreditei nas saídas fáceis para se resolver um
problema e, do mesmo modo, jamais tomei uma decisão ‘jogando para a torcida'”,
escreveu o atual prefeito.
Ele encerrou a mensagem dizendo ter feito uma “transição de
alto nível” com a futura gestão tucana. “Mantivemos uma relação cordial,
produtiva e transparente. Desejo, com toda a sinceridade, que ele tenha sucesso
na condução de uma cidade tão complexa e desafiadora como é São Paulo.”
Do Estadão Conteúdo, via ISTOÉ
E A VIDA, E O NOVO, O QUE É?
Joaquim Cunha, via Facebook
Meus amigos, minhas amigas, e assim estamos chegando a mais
um final de ano.
Como viu 2016, o que ocorreu de positivo conforme seu
sentimento, o que conta como negativo?
Olha, tudo é uma questão de visão, interpretação e
circunstâncias.
Às vezes, o que achamos negativo, foi na verdade, um grande
aprendizado para toda vida. E nem sempre o que sentimos como positivo, será
útil para muito tempo.
Aqui estamos na verdade, para evoluir espiritualmente, em
qualquer atividade que estejamos a desenvolver. Todos somos úteis, se
desejarmos sê-lo. Para isto, basta agirmos com amor e respeito ao próximo, não
cultivarmos mágoas nem ressentimentos, sermos misericordiosos com os menos evoluídos
espiritualmente e mais compreensivos com os vaidosos e oportunistas.
Estamos todos aqui para expiar, cada um conforme o seu
merecimento e missões que Deus nos atribuir, para que saibamos fazê-lo, dentro
dos princípios morais, éticos e Cristãos.
No mais, resta a todos, o livre arbítrio.
" Viver, e não ter a vergonha de ser feliz, cantar e
cantar e cantar, a beleza de ser um eterno aprendiz "
Salve a vida, busquemos a paz e a alegria dentro do
possível.
Sejamos andarilhos e pregadores da beleza da vida!
Salve 2017!
Feliz ano novo para todos! Um abraço, Joaquim Cunha e Família.
Joaquim Cunha, ex-prefeito de Gavião (BA) – Foi Presidente da Associação de Prefeitos da Região nordeste e Vice-Presidente da União dos Municípios da Bahia (UPB).
Joaquim Cunha, ex-prefeito de Gavião (BA) – Foi Presidente da Associação de Prefeitos da Região nordeste e Vice-Presidente da União dos Municípios da Bahia (UPB).
TRIBUTO AOS CAMPEÕES
Artigo de Fernando Gabeira
A repercussão do anúncio dos EUA sobre a ação global da Odebrecht provocou um temporal político na América Latina. Bem maior do que tivemos notícia pelos jornais e TV. Foi um intenso movimento no Twitter, que começou com gente perguntando quem eram os corruptos do governo de cada país, passou por desmentidos de presidentes e ex-presidentes, nomes suspeitos, acusações. Alguns importantes projetos, como assegurar a navegabilidade do Rio Magdalena, na Colômbia, estão ameaçados. Começaram a duvidar até do estudo de impacto ambiental da Odebrecht.
Ao ver aquele furacão durante a semana, não podia perder de vista que tudo aquilo havia sido causado por uma empresa brasileira. Ironicamente, o programa do BNDES para estimular as empresas campeãs nos deu apenas um título mundial: o do maior escândalo de corrupção.
Em termos de política externa, penso eu, seria ideal que o Brasil fizesse o comunicado, informando, como fizeram os americanos, quanto se usou em corrupção e o lucro obtido em cada lugar. Em termos ideais, porque, dados as circunstâncias brasileiras, o ritmo do STF, a delicada posição do governo na Lava Jato, não temos as mesmas condições dos norte-americanos. Verdade é que o próprio relatório divulgado lá destacou as investigações feitas no Brasil, pois trabalhou com dados, essencialmente, obtidos aqui.
Todos estão conscientes da abertura brasileira para compartilhar as informações. Em termos ainda ideais, seria preciso um outro passo: uma legislação disciplinando o comportamento das empresas no exterior.
Quando todo esse movimento rumo ao exterior começou, confesso que tentei formular uma lei que punisse o suborno de autoridades. Alguns assessores da Câmara ajudaram. Mas as possibilidades de êxito eram muito remotas. Não só pela força das empreiteiras. Havia um argumento muito forte: era uma iniciativa ingênua que acabaria reduzindo a competitividade de nossas empresas.
Com as voltas que o mundo deu, uma legislação que discipline as empresas brasileiras pode ser precisamente um instrumento para que não percam a competitividade depois do furacão Odebrecht.
O relatório americano não menciona o papel que o BNDES teve em cada um dos projetos da Odebrecht. Quando tudo isso vier à luz, talvez se desvende que o dinheiro da propina eram recursos públicos.
Uma legislação mais precisa pode evitar que instituições sejam levadas para uma engrenagem criminosa internacional. Mas talvez não seja a falta dela o ponto essencial.
Havia toda uma política, da qual o BNDES era um instrumento, destinada simultaneamente a abrir caminhos para a Odebrecht e fortalecer a imagem de Lula. Os métodos escolhidos para isso resultaram num desastre, pois fecharam os caminhos da Odebrecht e atingiram profundamente a imagem de Lula na América Latina.
A escolha equivocada jogou-os num enredo e crime e castigo. Mas a Odebrecht era considerada a maior empreiteira brasileira atuando no exterior, Lula é o ex-presidente do Brasil. Por mais que tenha nascido e se desenvolvido aqui a investigação que revelou o gigantesco esquema, o Brasil tem um delicado problema externo a superar.
O passo que sugiro é criar legislação que possa atenuar a desconfiança em torno de empresas brasileiras no exterior.
Enquanto o esquema era revelado somente dentro do Brasil, alguns lugares do mundo não se interessaram por ele. Mas agora que pelo menos nove países se deram conta da interface Odebrecht-Lula com os seus próprios políticos e administradores, a América Latina tornou-se uma única aldeia escandalizada.
Outra resposta brasileira que poderia inspirar outros países envolvidos no escândalo seria romper o vínculo entre empreiteiras e governo. Para isso é preciso aprovar um projeto, que já está no Congresso, obrigando a mediação de empresas seguradoras, responsáveis por fiscalizar as obras.
Governo e Congresso estão pisando em ovos com a Operação Lava Jato. Em vez de definirem as alternativas que se abrem com seu desdobramento, preferem discutir como contê-la. No entanto, não acho insensato pressioná-los a se dar conta do que está acontecendo em torno de nós, depois que o relatório americano foi divulgado. Muitos são investigados na Lava Jato. Investigadas ou não, as pessoas podem fazer as coisas certas quando se colocam problemas nacionais. Isso, todavia, não vai absolvê-las nem condená-las.
A dimensão da Lava Jato nos obriga a ir um pouco além do quem recebeu quanto para quê, quando eles serão julgados. O escândalo anexou uma dimensão internacional ao drama e atingiu a imagem do Brasil, por causa do comportamento de seu Lula e das empresas que gravitavam em torno do BNDES.
Pode-se escolher a tática de fingir que não foi conosco, submergir à espera de um melhor momento. Isso costuma falhar. Um título mundial de corrupção não se esquece rapidamente. É preciso correr atrás da credibilidade perdida. O julgamento dos artífices do gigantesco esquema de corrupção será, certamente, uma grande resposta.
E, antes dela, também ajudaria a transparência sobre a delação da Odebrecht. Não é confortável ler algo que aconteceu no Brasil, foi apurado aqui, narrado em inglês com os políticos sendo chamados de brazilian officials e numerados.
O brazilian official número 1, por exemplo, deveria dar uma parada para pensar no rastro de raiva que deixou essa aliança entre corruptos latino-americanos. A prática de roubar o próprio povo transcendeu as fronteiras nacionais. Um fato histórico.
Os líderes comunistas do passado criaram internacionais para marcar posições políticas diferentes. A decadência chegou ao ponto de se criar a partir do Brasil uma internacional da corrupção. Nela, América Latina e África foram unidas pelos seus defeitos, e não pelas qualidades.
Há todo um caminho a reconstruir.
Artigo publicado no Estadão em 30/12/2016
A repercussão do anúncio dos EUA sobre a ação global da Odebrecht provocou um temporal político na América Latina. Bem maior do que tivemos notícia pelos jornais e TV. Foi um intenso movimento no Twitter, que começou com gente perguntando quem eram os corruptos do governo de cada país, passou por desmentidos de presidentes e ex-presidentes, nomes suspeitos, acusações. Alguns importantes projetos, como assegurar a navegabilidade do Rio Magdalena, na Colômbia, estão ameaçados. Começaram a duvidar até do estudo de impacto ambiental da Odebrecht.
Ao ver aquele furacão durante a semana, não podia perder de vista que tudo aquilo havia sido causado por uma empresa brasileira. Ironicamente, o programa do BNDES para estimular as empresas campeãs nos deu apenas um título mundial: o do maior escândalo de corrupção.
Em termos de política externa, penso eu, seria ideal que o Brasil fizesse o comunicado, informando, como fizeram os americanos, quanto se usou em corrupção e o lucro obtido em cada lugar. Em termos ideais, porque, dados as circunstâncias brasileiras, o ritmo do STF, a delicada posição do governo na Lava Jato, não temos as mesmas condições dos norte-americanos. Verdade é que o próprio relatório divulgado lá destacou as investigações feitas no Brasil, pois trabalhou com dados, essencialmente, obtidos aqui.
Todos estão conscientes da abertura brasileira para compartilhar as informações. Em termos ainda ideais, seria preciso um outro passo: uma legislação disciplinando o comportamento das empresas no exterior.
Quando todo esse movimento rumo ao exterior começou, confesso que tentei formular uma lei que punisse o suborno de autoridades. Alguns assessores da Câmara ajudaram. Mas as possibilidades de êxito eram muito remotas. Não só pela força das empreiteiras. Havia um argumento muito forte: era uma iniciativa ingênua que acabaria reduzindo a competitividade de nossas empresas.
Com as voltas que o mundo deu, uma legislação que discipline as empresas brasileiras pode ser precisamente um instrumento para que não percam a competitividade depois do furacão Odebrecht.
O relatório americano não menciona o papel que o BNDES teve em cada um dos projetos da Odebrecht. Quando tudo isso vier à luz, talvez se desvende que o dinheiro da propina eram recursos públicos.
Uma legislação mais precisa pode evitar que instituições sejam levadas para uma engrenagem criminosa internacional. Mas talvez não seja a falta dela o ponto essencial.
Havia toda uma política, da qual o BNDES era um instrumento, destinada simultaneamente a abrir caminhos para a Odebrecht e fortalecer a imagem de Lula. Os métodos escolhidos para isso resultaram num desastre, pois fecharam os caminhos da Odebrecht e atingiram profundamente a imagem de Lula na América Latina.
A escolha equivocada jogou-os num enredo e crime e castigo. Mas a Odebrecht era considerada a maior empreiteira brasileira atuando no exterior, Lula é o ex-presidente do Brasil. Por mais que tenha nascido e se desenvolvido aqui a investigação que revelou o gigantesco esquema, o Brasil tem um delicado problema externo a superar.
O passo que sugiro é criar legislação que possa atenuar a desconfiança em torno de empresas brasileiras no exterior.
Enquanto o esquema era revelado somente dentro do Brasil, alguns lugares do mundo não se interessaram por ele. Mas agora que pelo menos nove países se deram conta da interface Odebrecht-Lula com os seus próprios políticos e administradores, a América Latina tornou-se uma única aldeia escandalizada.
Outra resposta brasileira que poderia inspirar outros países envolvidos no escândalo seria romper o vínculo entre empreiteiras e governo. Para isso é preciso aprovar um projeto, que já está no Congresso, obrigando a mediação de empresas seguradoras, responsáveis por fiscalizar as obras.
Governo e Congresso estão pisando em ovos com a Operação Lava Jato. Em vez de definirem as alternativas que se abrem com seu desdobramento, preferem discutir como contê-la. No entanto, não acho insensato pressioná-los a se dar conta do que está acontecendo em torno de nós, depois que o relatório americano foi divulgado. Muitos são investigados na Lava Jato. Investigadas ou não, as pessoas podem fazer as coisas certas quando se colocam problemas nacionais. Isso, todavia, não vai absolvê-las nem condená-las.
A dimensão da Lava Jato nos obriga a ir um pouco além do quem recebeu quanto para quê, quando eles serão julgados. O escândalo anexou uma dimensão internacional ao drama e atingiu a imagem do Brasil, por causa do comportamento de seu Lula e das empresas que gravitavam em torno do BNDES.
Pode-se escolher a tática de fingir que não foi conosco, submergir à espera de um melhor momento. Isso costuma falhar. Um título mundial de corrupção não se esquece rapidamente. É preciso correr atrás da credibilidade perdida. O julgamento dos artífices do gigantesco esquema de corrupção será, certamente, uma grande resposta.
E, antes dela, também ajudaria a transparência sobre a delação da Odebrecht. Não é confortável ler algo que aconteceu no Brasil, foi apurado aqui, narrado em inglês com os políticos sendo chamados de brazilian officials e numerados.
O brazilian official número 1, por exemplo, deveria dar uma parada para pensar no rastro de raiva que deixou essa aliança entre corruptos latino-americanos. A prática de roubar o próprio povo transcendeu as fronteiras nacionais. Um fato histórico.
Os líderes comunistas do passado criaram internacionais para marcar posições políticas diferentes. A decadência chegou ao ponto de se criar a partir do Brasil uma internacional da corrupção. Nela, América Latina e África foram unidas pelos seus defeitos, e não pelas qualidades.
Há todo um caminho a reconstruir.
Artigo publicado no Estadão em 30/12/2016
sexta-feira, 30 de dezembro de 2016
PRISÃO DECRETADA
A Justiça do Rio decretou a prisão do prefeito de São Gonçalo, Neilton Mulim (PR), por crime de desobediência de ordem judicial. O prefeito, que concorreu à reeleição nas eleições de outubro e acabou derrotado, não efetuou o pagamento dos salários dos funcionários da rede municipal de ensino como havia determinado a Justiça, após ação movida pelo Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação do Rio de Janeiro (Sepe-RJ).
A decisão é do desembargador Peterson Barroso Simão, do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) e foi proferida na noite de quarta-feira, 28, durante o Plantão Judiciário. No despacho, o magistrado ressaltou que Neilton Mulim não respeitou decisão anterior e que age de forma a dificultar o recebimento da ordem judicial.
"Este litígio está se tornando extremamente vergonhoso para quem não cumpre as decisões da Justiça de forma reiterada, que é exatamente o Sr. Prefeito do município de São Gonçalo. Já houve uma determinação do desembargador Custódio de Barros Tostes (da 1ª Câmara Cível do TJ-RJ) para que se procedesse ao pagamento dos professores. No Plantão Judiciário do dia 22/12/2016, o eminente desembargador plantonista novamente determinou o cumprimento do pagamento dos vencimentos dos professores", escreveu Barroso Simão.
Na mesma decisão, o desembargador determina que o substituto do prefeito efetue imediatamente o pagamento dos servidores. A procuradoria do município de São Gonçalo está recorrendo.
Da Agência Estado, via UOL
A decisão é do desembargador Peterson Barroso Simão, do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) e foi proferida na noite de quarta-feira, 28, durante o Plantão Judiciário. No despacho, o magistrado ressaltou que Neilton Mulim não respeitou decisão anterior e que age de forma a dificultar o recebimento da ordem judicial.
"Este litígio está se tornando extremamente vergonhoso para quem não cumpre as decisões da Justiça de forma reiterada, que é exatamente o Sr. Prefeito do município de São Gonçalo. Já houve uma determinação do desembargador Custódio de Barros Tostes (da 1ª Câmara Cível do TJ-RJ) para que se procedesse ao pagamento dos professores. No Plantão Judiciário do dia 22/12/2016, o eminente desembargador plantonista novamente determinou o cumprimento do pagamento dos vencimentos dos professores", escreveu Barroso Simão.
Na mesma decisão, o desembargador determina que o substituto do prefeito efetue imediatamente o pagamento dos servidores. A procuradoria do município de São Gonçalo está recorrendo.
Da Agência Estado, via UOL
DO BRASIL E SEUS HERÓIS
Alberto Dines, Observatório da Imprensa
Na mesma edição de jornal , 21 caixões e vários corpos ”encontrados” dividem as chamadas com a privada polonesa de 500 dólares da
ex-Primeira Dama do Rio, Adriana Anselmo, e os 20 ternos Ermenegildo Zegna do
marido e então governador do Rio de Janeiro ,Sérgio Cabral, o filho. Na mesma matéria , a renúncia do ex-Ministro
da Cultura, Marcelo Calero , acusando “pressão ” de Geddel Vieira Lima pedindo
para interferir no IPHAN na liberação de um apartamento de R$ 2 .5 milhões
comprado em Salvador pelo ministro baiano. Pela explicação do ministro, foram
apenas “ponderações” , “mal entendidos” .
Enquanto um via suborno e aviltamento , o
outro ironizava sobre a ” doçura” do
diplomata Calero que não entendeu o espírito de como se faz política em
Brasília. Calero negou-se a aceitar o projeto estapafúrdio da vaquejada como
cultura e da maracutaia como forma de fazer política. Na suíte do caso, Temer
teria enquadrado Calero, o caso acabou respingando no presidente, mas Calero
saiu, Geddel ficou — só não aguentou a pressão, agora da população inteira, e
uma semana depois pediu “exoneração do honroso cargo”.Tarde. Na mesma denúncia
de propina nas páginas que destrincham a falência do Rio, vem a explicação de
uma simples “oxigenação “.
Na mesma revolta da população inteira que inclui canto de
servidores revoltados com trechos de Carmina Burana de Carl Orff e Carmen de
Bizet diante da Assembléia Legislativa do Rio, a declaração de Sergio Cabral ,
“estou com a consciência limpa, indignado com acusações “.Neste Brasil grande
cabe tudo , Caixa Dois por um lado e pressa para descriminalizar o que é crime.
Esta semana Temer montou o Conselho de Desenvolvimento
Econômico e Social alegando que assumiu um Brasil com déficits de verdade e
muito ilusionismo contábil. Garantiu “entramos na era da lucidez”. Na mesma
edição , Temer qualificava então o escândalo Calero-Geddel de “um acidente”
menor.
O mesmo ex-governador do Rio, Antônio Garotinho, que ía
levar ” um bombom Garoto” para Sérgio Cabral quando o desafeto fosse preso,
acabou em Bangu, junto com Cabral. Antes
, tentou oferecer R$ 5 milhões para não ser preso e apresentou um diploma
universitário duvidoso para escapar do xilindró.
A era do esquecimento
Um bombom, um acarajé, um kibe, bacalhau, propina não. ”
Fumar um charuto”, “tomar um vinho”, assim o ex-diretor de Serviços da Petrobrás ,Renato Duque ,
marcava encontros com os operadores para receber contratos malocados. O
ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto cunhou como ” pixuleco” aquilo que
Carlinhos Cachoeira preferia denominar ” assistência social”. Luis Rogério
Gonçalves Magalhães em conversa com Wagner Garcia , preso em Bangu, preferiu
noticiar três dias antes a prisão de Cabral assim, “entregou a rapadura com
raspas de limão”. Já Cabral preferia
negociar propinas com a Andrade Gutierrez utilizando nome de mulher, Nelma de
Sá Saraca, em alusão à histórica secretária d’O Pasquim, tabloide fundado entre outros pelo Sergio
Cabral pai, criador do musical Sassaricando.
A era é a do esquecimento, Sergio Cabral não sabe como pagou
as joias da mulher em dinheiro vivo, algumas no valor de R$100 mil. Sua mulher
não sabe como R$ 10 milhões foram parar na sua conta. A era é a do
deslumbramento, da ostentação, do triplex em Guarujá que é de ninguém, de mais
uma delação premiada do senador cassado Delcídio Amaral dizendo que o
ex-presidente Lula, que não sabia de nada , tinha ” conhecimento absoluto “. E
todo Congresso, que diz não temer nada,
tremendo diante do acordo de delação dos 80 executivos da Odebrecht,
empreiteira que mantinha um departamento de propina para suprir as demandas e
agora pode atingir 130 políticos.
A era é a da pos-verdade, do virtual que não é real, da
anti-humanidade de Donald Trump respingando temores nos ilegais brasileiros. A
era é a do nacionalismo , da ultradireita antissemita, racista, xenófoba,
homofóbica, neonazista ganhando espaço no mundo. A era é a da pós Petrobrás,
empresa das mais poderosas do mundo , transformada na mais endividada do
planeta com 132 bilhões de dólares. E é ainda o pré-sal, os royalties do pré
sal que vão saldar parte do endividamento dos estados.
Na era da “lucidez ” que é a dos reality shows, devem se
suceder as operações Calicut, My Way, Nessum Dorma, Caça-Fantasma, Resta Um e
uma nação que segue atônita com verdades partidas, em busca de seus heróis– ou
pelo menos de políticos éticos –, e de um espelho que não reflita a face de uma
pós-verdade tão mentirosa.
Alberto Dines é jornalista, escritor e cofundador do
Observatório da Imprensa
quinta-feira, 29 de dezembro de 2016
PEDÁGIO PÉ NA AREIA
O beatle Paul McCartney hospedou-se no município de
Governador Celso Ramos (a 43 km de Florianópolis) quando passou em turnê por
Santa Catarina, em 2012.
A cantora pop Beyoncé também refugiou-se na cidade de 16 mil
habitantes ao se apresentar na capital catarinense, em 2010. A top model Gisele
Bündchen já passou férias no município de 40 praias, a maioria quase intocada.
Frequentada por famosos que procuram sossego e privacidade, Governador Celso
Ramos é a mais nova cidade do litoral de Santa Catarina a criar uma TPA (Taxa
de Preservação Ambiental).
Há iniciativas do tipo sendo discutidas em outras cidades de
praia, como Laguna, no litoral sul, Balneário Camboriú, no litoral norte, e
Florianópolis. Em nenhuma delas, porém, há data prevista para o início da
cobrança. Outras cidades do país adotaram a medida. A turística Porto Seguro
(BA) aprovou no dia 15 de dezembro uma diária de R$ 2 por turista, que será
inclusa para quem se hospedar na cidade.
Governador Celso Ramos vai começar a taxar os visitantes na próxima
temporada, 2017/2018. O preço será de R$ 5 para moto, R$ 20 para carro e R$ 120
para ônibus. O turista poderá pagar na cidade ou receber boleto em casa, pela
placa do veículo.
O prefeito Juliano Duarte Campos (PSD) diz que a taxa
ajudará na preservação do ambiente e permitirá à prefeitura não gastar com
turismo o que poderia investir em saúde e educação.
A cobrança não é consenso no município. Mas a aceitação é
alta entre comerciantes e moradores porque, dada a falta de atrativos
turísticos além das praias, a maioria dos visitantes volta para casa no fim do
dia. De acordo com a prefeitura, o município chega a receber 100 mil pessoas
por dia na alta temporada.
MODELO
As iniciativas e discussões sobre TPA no litoral catarinense
se intensificaram a partir de janeiro de 2015, quando Bombinhas, no litoral
norte, em uma atitude pioneira no Estado e rara no país, começou a taxar os
visitantes.
A prefeita da cidade, Ana Paula da Silva (PDT), diz que a
taxa "é um acerto" porque gera receita para reparar danos ambientais
provocados pelo turismo. Para ela, se Bombinhas não contasse com a taxa, seus
atrativos naturais "entrariam em colapso em poucos anos".
O município de 18.052 habitantes recebe cerca de 800 mil
veranistas todos os anos na alta temporada. A taxa é cobrada entre os meses de
novembro e abril. Motos pagam R$ 3. Carros, R$ 24. No caso dos ônibus, R$120.
Na temporada 2015/2016, essa taxa gerou uma receita de R$ 12,5 milhões à
cidade, que vive do setor de turismo e da pesca. Como comparação, o orçamento
de Bombinhas de 2016 foi de R$ 93 milhões.
A prefeitura diz que investiu o dinheiro arrecado na limpeza
das praias, na instalação de banheiros e lixeiras e na criação de um parque
municipal. Vereadores de oposição, no entanto, afirmam que o gasto não é
transparente, e neste ano criaram uma CPI para investigar.
O Ministério Público de Santa Catarina tenta impedir a
cobrança, alegando que a taxa é "discriminatória" e "impede o
livre trânsito". O caso está sendo avaliado no Tribunal de Justiça.
ILHA
Em Florianópolis há dois projetos de taxas ambientais em
discussão desde 2015. O principal deles foi proposto pela empresa controlada
pela prefeitura responsável pela limpeza pública. Ela prevê taxar o turista só
em determinadas praias, com uma única cobrança de R$ 22 por temporada. O boleto
seria enviado à casa do motorista.
O outro projeto prevê cobranças a partir de R$ 10 em uma
área maior da cidade. As duas propostas têm recebido críticas, principalmente
de entidades ligadas ao comércio. Taxas de proteção ambiental são raras no
país. Há modelos em Fernando de Noronha (PE), Ilhabela (SP) e Morro de São
Paulo (BA).
No entanto, outros destinos de praia do país, como Búzios e
Angra dos Reis (RJ), estudam este tipo de cobrança. O Ministério do Turismo diz
não ter um levantamento de quantas cidades de praia cobram pedágio ambiental.
LEGISLATIVOS PERDULÁRIOS
Do UOL
Os vereadores de todas as 26 capitais estaduais recebem
muito mais que a renda média do trabalhador nessas cidades. Em 21 delas, os
vencimentos dos parlamentares para a próxima legislatura, com início em 2017,
representam, ao menos, cinco vezes a renda média do trabalho, de acordo com
levantamento feito pela reportagem do UOL com base em informações fornecidas
pelas Câmaras municipais e em dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Em meio à crise financeira do país, a aprovação de reajuste
para vereadores provocou protestos em São Paulo.
Com o aumento aprovado nesta quarta-feira (28), na última
sessão do ano, Maceió passa a ter a diferença mais gritante na comparação com
os rendimentos dos trabalhadores. Os vereadores da capital de Alagoas vão
receber R$ 18.986,00 por mês, mais de 11 vezes a renda média atual dos
moradores da cidade, que era de R$ 1.710 no terceiro trimestre deste ano, de
acordo com dado mais recente disponível na Pnad.
A segunda maior diferença foi constatada em Teresina. Lá os
vereadores vão receber R$ 18.880,38 por mês, mais de dez vezes a renda média
atual dos moradores da cidade, que era de R$ 1.818.
Em Salvador, os vereadores terão salário de R$ 18.732,56,
mais de nove vezes o rendimento de um trabalhador da capital baiana, que era de
R$ 2.022 ao fim de setembro.
Em São Luís, os legisladores eleitos ganharão R$ 15.031,76,
também nove vezes o salário médio dos moradores: R$ 1.654. A capital do
Maranhão apresenta o mais baixo rendimento médio do trabalho entre as 26
capitais.
No cenário menos discrepante, verificado em Vitória, os
vereadores ganharão R$ 8.370,30 por mês, o dobro do rendimento médio dos
moradores, que estava em R$ 4.109, de acordo com a Pnad Contínua. A capital do
Espírito Santo tem os salários de vereadores mais baixos e o rendimento médio
do trabalho mais alto entre as capitais estaduais.
Veja na tabela abaixo as diferenças nestas cidades,
ordenadas pelas capitais com maior variação entre o salário dos vereadores e
dos trabalhadores.
Nas cidades com os salários nominais de vereadores mais
altos, a diferença para a média também é significativa. Em Aracaju e no Rio de
Janeiro, os vereadores ganham seis vezes o salário dos trabalhadores --quase
sete no caso da capital sergipana.
Em São Paulo, o teto salarial dos vereadores previsto na
Constituição só não foi atingido porque a Justiça suspendeu o reajuste --ainda
cabe recurso. Depois de quatro anos sem aumentos, os vereadores decidiram
aprovar um reajuste de 26,3%, abaixo da inflação acumulada no período. Em
protesto, manifestantes ocuparam o gabinete da Presidência da Câmara.
Aumento de salários em 16 capitais
Nos quatros anos da atual legislatura, os vereadores
reajustaram seus próprios salários em ao menos 16 capitais (ver tabela ao fim
do texto). O maior índice de aumento --e também o único acima da inflação-- foi
registrado em Boa Vista. Os vereadores da capital de Roraima começarão o
próximo mandato ganhando R$ 15.100, um avanço de 43,81% frente ao salário de
2013 --acima dos 32,17% de inflação registrados pelo IPCA entre janeiro de 2013
e novembro de 2016.
Os vereadores do Recife decidiram fazer o contrário. Foram
os únicos a diminuir seus salários. A redução será de 2,64%. Assim, o
vencimento bruto para a próxima legislatura será de R$ 14.635.
"A conduta [dos vereadores do Recife] é perfeita e é a
desejada numa situação de crise. Até porque o pagamento de subsídios a
vereadores é questionável. Em muitos países do mundo, quem cumpre esse papel
não é nem remunerado", diz Marcelo Figueiredo, professor de Direito
Constitucional da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).
"Faz muito sentido [a decisão dos vereadores do
Recife]. Estamos com um PIB negativo, faltando dinheiro para saúde, educação. É
uma escolha razoável. Até porque vereador não tem dedicação exclusiva, tem
sessão algumas vezes por semana e consegue acumular com outras funções",
concorda Carlos Eduardo Moraes, especialista em Direito Eleitoral e
Administrativo e professor da EPD (Escola Paulista de Direito).
Como funcionam as regras
"As Câmaras não são obrigadas a reajustar os valores.
Ao contrário, a lei só estabelece um teto para esse reajuste, que deve ser de
até 75% do que ganham os deputados estaduais", explica Moraes. O teto
válido para cidades com mais de 500 mil habitantes é hoje de R$ 18.991,68.
Em quatro capitais, os vereadores já ganham ou vão passar a
ganhar salários próximos ao teto estabelecido pela Constituição: Aracaju, Rio
de Janeiro, Cuiabá e Teresina. A cidade de São Paulo entrará nesta lista caso a
decisão judicial seja derrubada.
O valor do subsídio pago aos vereadores é regulado pelo
artigo 29 da Constituição Federal, segundo o qual o valor deve ser fixado pelas
Câmaras municipais "em cada legislatura para a subsequente". Ou seja,
os vereadores são proibidos de aumentar os próprios salários. O ajuste só pode
ser feito para aqueles que ocuparão as cadeiras da Câmara no próximo mandato.
A regra, no entanto, não leva em conta que pode haver
políticos reeleitos de um mandato para outro. Em São Paulo, 21 dos 33 vereadores
reeleitos votaram a favor do aumento a partir de 2017.
Ao mesmo tempo em que só permite aumentos de salários para a
legislatura seguinte, a Constituição também dá a detentores de mandatos
eletivos o direito a uma "revisão geral anual" de seus salários. Em
Fortaleza, por exemplo, os vereadores aprovaram uma reposição salarial de
10,67% em março. Em Teresina, houve reajuste de 10,36% neste ano.
"Já houve casos em que os vereadores argumentaram que o
valor proposto era correção e não aumento, mas a alteração no valor acabou
sendo considerada inconstitucional", afirma Marcelo Figueiredo.
Segundo Floriano Peixoto de Azevedo, professor de direito da
USP (Universidade de São Paulo), o subsídio foi instituído pela Constituição de
1988 para que os salários tenham um teto e para que outros valores não sejam
somados a ele, como gratificações, adicionais e abonos. "Foi introduzido
na Constituição para evitar penduricalhos, mas aqui e acolá vemos tentativas de
burla", comenta.
Verba de gabinete
Apesar da existência do teto, os vereadores administram
outros recursos. Em São Paulo, a verba de gabinete disponível --dinheiro para
pagar assessores-- é de R$ 143.563,67 para a contratação de até 17 pessoas. Já
no Rio, os vereadores têm à disposição R$ 99.260,27 para distribuir entre até
20 ocupantes de cargos comissionados.
Em Belo Horizonte, a verba de gabinete chega a R$ 59.461,25,
para até 18 servidores. Em Goiânia, estes recursos são de R$ 51.760,21, com
direito a até 12 assessores.
Em Vitória, onde os vereadores ganham o menor salário entre
as capitais, a verba de gabinete soma R$ 34.209,83. Até este ano, os
parlamentares podiam usar esse dinheiro para contratar 20 assessores. A partir
de 2017, os vereadores terão direito a 15 auxiliares --mas a verba será a
mesma.
Já em Maceió, a verba de gabinete é de R$ 10.500, enquanto
em Boa Vista o valor é de R$ 10 mil.
quarta-feira, 28 de dezembro de 2016
ADMINISTRAÇÃO INDÍGENA
Do UOL
A cidade mais indígena do Brasil é também a que mais elegeu
políticos de origem indígena nas últimas eleições municipais. São Gabriel da
Cachoeira (AM) tem 92% de seu território classificado como terras indígenas,
76,6% de sua população autodeclarada indígena --pertencente a 23 etnias-- e
elegeu em outubro último sete vereadores e um prefeito provenientes dos povos
nativos da região.
A partir de 1º de janeiro de 2017, o município --que junto
ao português conta com três idiomas oficiais: o nheengatu, o tucano e o baníua--
será comandado pelo índio tariano Clovis Moreira Saldanha, 44, conhecido na
região como Clóvis Curubão. Ele terá, pelo Partido dos Trabalhadores, sua
primeira experiência na política e, em seu mandato, também contará com uma
bancada indígena: sete dos 13 vereadores eleitos são índios --dois deles são
correligionários do PT, três compõem a coligação PSL/PMN/PV/PPS/PP e outros
dois são da chapa PR/DEM/PMB.
Curubão faz parte de uma classe política formada por
cidadãos originários dos povos nativos do Brasil que ainda busca um maior
espaço. Nas eleições municipais deste ano, 28 indígenas se candidataram a
prefeituras, dos quais cinco conseguiram se eleger. No Legislativo municipal,
foram 167 eleitos em um universo de 1.531 postulantes ao cargo. Foi a primeira
vez que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) detalhou informações sobre a
questão étnica e racial em seu mapeamento.
As cidades que contarão com mandatários indígenas a partir
de 2017, além de São Gabriel da Cachoeira (AM), são: Marcação (PB), com a potiguara
Lili (PDT); Marechal Thaumaturgo (AC), com o ashaninka Isaac Piyãko (PMDB);
Tacaratu (PE), com o pankararu Gerson (PSB); e Lajedo (PE), com o xucuru
Rossine (PSD). A sexta cidade seria Jacundá (PA), mas o prefeito eleito Zé
Martins (PMDB), ao contrário do que aponta seu registro no TSE, refutou à
reportagem do UOL ter ascendência indígena. "Não tenho nada a ver com
índio, foi um erro de registro", afirmou.
Os indígenas também conseguiram emplacar vereadores em 107
municípios brasileiros. Dois deles, São Gabriel da Cachoeira (AM) e Marcação
(PB), além de contarem com prefeitos indígenas eleitos, também terão
expressivas bancadas de povos autóctones a legislar a partir do ano que vem.
Entre os partidos com mais representantes eleitos estão o PT (19 vereadores), o
PMDB (17) e o PSDB (13).
Gigante em extensão
São Gabriel da Cachoeira (AM) é a terceira maior cidade em
extensão do Brasil (10.974.380 hectares, maior que a soma das áreas de Rio de
Janeiro, Alagoas, Sergipe e Distrito Federal juntas) e tem em seu território
sete diferentes terras indígenas: Alto Rio Negro, Balaio, Cué Cué/Marabitanas,
Médio Rio Negro 1, Médio Rio Negro 2, Rio Téa e Yanomâmi.
Clovis Curubão (PT) foi eleito prefeito com 4.649 votos, ou
30,19% dos votos válidos do pleito municipal. O mandato de quatro anos à frente
de São Gabriel da Cachoeira (AM) será a primeira experiência em um cargo
público do comerciante. Política, no entanto, ele já faz. "Há tempos tenho
trabalhado a temática da sustentabilidade dos povos indígenas desta
municipalidade, em especial das comunidades mais interioranas, mais
afastadas", disse ao UOL o índio tariano.
O petista foi eleito após uma gestão controversa, marcada
por acusações de corrupção, de Rene Coimbra (PCdoB), um ex-funcionário da Funai
(Fundação Nacional do Índio) que teve 6,9% dos votos válidos na eleição
municipal. Curubão afirma que os habitantes do município "pediram mudanças
na forma de ouvir anseios e pessoas novas" e que sua eleição foi "um
recado explícito da necessidade de mudanças na forma de fazer política neste
município mais indígena do Brasil".
A distância geográfica das comunidades indígenas da sede do
município, para ele, será uma das dificuldades a serem enfrentadas na aplicação
das políticas públicas para este segmento da população local. A geração de
renda com estímulo de trabalhos relacionados a sustentabilidade é o maior
desafio. "Nosso trabalho foi apoiado pela militância dos indígenas que
querem novas propostas políticas de trabalho."
Em sua proposta de governo enviada ao TSE, a palavra
"indígena" aparece em três oportunidades: na intenção da busca por
energias renováveis para os distritos e comunidades indígenas, na valorização
da medicina tradicional indígena e na implementação e apoio aos jogos
indígenas.
Pôr em prática o que se faz na aldeia
Rossine Blesmany dos Santos Cordeiro, 47, é da tribo xucuru,
natural de Pesqueira (PE), mas fez sua carreira política na também pernambucana
Lajedo. Reeleito para o cargo de prefeito, será o único a comandar uma cidade
sem terras indígenas.
Sua vivência em aldeias e sua experiência como "gestor
indígena", para ele, é importante na "valorização do homem do
campo" no município onde é, e continuará a ser, prefeito. "Como
gestor, eu coloco em prática o que os índios fazem nas aldeias. Preservar a
natureza e conseguir a subsistência da própria terra. Isso a gente vem
colocando em prática há quatro anos em Lajedo", afirmou.
"A coisa que eu mais uso na política é valorizar, dar
condições ao povo do campo permanecer no campo. Trabalhar e sobreviver no
campo. E sempre estar orientando que no campo você pode gerar renda sem
prejudicar o meio ambiente", completou.
Caminhos
De acordo com o Censo de 2010 do IBGE, a população indígena
no Brasil é de 896.917 pessoas, o que corresponde aproximadamente a 0,47% da
população total do país. Em todo o território nacional, existem, segundo a
Funai (Fundação Nacional do Índio), 588 terras indígenas.
Proporcionalmente, o número de prefeitos e vereadores
indígenas eleitos no último pleito é ainda menor: 0,08% entre os prefeitos e
0,28% entre os vereadores.
Para Ricardo Weipe, o Weipe Tapiba (PT), primeiro indígena
eleito vereador em Caucaia (CE) e integrante do Conselho Nacional de Política
Indigenista (CNPI), órgão vinculado à Presidência da República e responsável
pela elaboração, acompanhamento e implementação de políticas públicas voltadas
aos povos indígenas, "essa representação no Parlamento, no Poder Executivo
dos municípios, ainda é muito pouca".
Ele ressalta, porém, que a busca por um maior espaço na
política "é um caminho que os povos indígenas têm utilizado para que a
gente consiga ocupar espaço de protagonista que a gente tem na construção da
história do Brasil".
"A gente tem presenciado nos municípios, nos Estados e
também no Congresso Nacional muitas medidas antidireitos indígenas, antipovos
indígenas e aí as comunidades têm a estratégia de também participar dos pleitos
eleitorais para que a gente consiga ter participação nos Parlamentos dos
municípios e também conseguir alcançar o Poder Legislativo e o Congresso
Nacional. O caminho é esse", afirmou o índio tapeba.
terça-feira, 27 de dezembro de 2016
RÉVEILLON NO PRESÍDIO
Do UOL
O prefeito eleito de Osasco, na Grande São Paulo, Rogério
Lins (PTN), foi transferido na manhã desta terça-feira (27) para a
penitenciária de Tremembé, no interior do Estado. Ele passou duas noites na
cadeia pública de Osasco após ter se entregado à polícia no domingo (25). Antes
de ser preso, Lins estava em Miami e era considerado foragido.
Atualmente vereador em licença, Lins é alvo de um mandado de
prisão preventiva na Operação Caça Fantasmas, que apura um suposto esquema
milionário de fraudes na contratação sem concurso público de centenas de
servidores, mantendo funcionários fantasmas nos gabinetes.
Considerado uma zebra no início da campanha, Lins bateu em
segundo turno o atual mandatário de Osasco, Jorge Lapas (PDT). Com 100% das
urnas apuradas, Lins obteve 61,21% dos votos, contra 38,79% de Lapas.
Aos 38 anos de idade, ele é empresário. Possui duas empresas
em Osasco. Quando as urnas lhe deram a vitória, Lins foi taxativo ao declarar
seu compromisso com a ética e o bem público. Ele afirmou que iria
"respeitar o dinheiro público da nossa população".
"É tolerância zero com a corrupção", declarou à
época.
Caça Fantasmas
No último dia 6, o Ministério Público de São Paulo deflagrou
a quinta fase da Operação Caça Fantasmas ao cumprir 14 mandados de prisão --
todos contra vereadores de Osasco . Os prejuízos aos cofres públicos em
decorrência do esquema são estimados em pelo menos R$ 21 milhões.
Durante a investigação ainda em curso, o MP paulista já
ofereceu denúncia contra 217 pessoas, entre vereadores, assessores e
funcionários "fantasmas". Desde que foi iniciada, em agosto de 2015,
a operação já conta com 117 volumes de investigação. Mais de 200 pessoas foram
afastadas de seus cargos cautelarmente pela Justiça, a pedido do MP de São
Paulo.
COMBATE À SECA
Do G1, AL
O presidente Michel Temer (PMDB) anunciou nesta terça-feira
(27), em Maceió, a destinação de R$ 756 milhões para combater a seca em 15
estados do semiárido brasileiro e da Amazônia (confira na tabela). Do lado de
fora, manifestantes fizeram um protesto contra o peemedebista.
Para ajudar a minimizar os efeitos da estiagem prolongada em
diversos municípios, cerca de R$ 250 milhões são da repatriação de dinheiro
mantido por brasileiros no exterior. Outros R$ 255 milhões da reativação de 40
convênios entre o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, estados e
municípios e o restante está previsto na Lei Orçamentária Anual de 2017.
"Vocês ouviram aqui um grande debate de tudo o que o
governo federal está fazendo para o Nordeste. Naturalmente, tudo isso passa
pela minha mesa. É que eu tenho um objetivo e um sonho. Meu objetivo e meu
sonho é que, ao final do meu mandato, que embora sendo eu de São Paulo, vocês
possam dizer que esse foi o maior presidente nordestino que passou pelo
Brasil", disse Temer.
De acordo com o governo do estado, Alagoas receberá mais de
R$ 67 milhões deste montante, que serão investidos na instalação de 500
cisternas nas escolas do Agreste e do Sertão.
Também participaram da solenidade no Centro Cultural e de
Exposições Ruth Cardoso, no bairro de Jaraguá, o governador de Alagoas, Renan
Filho (PMDB), o prefeito de Maceió, Rui Palmeira (PSDB), ministros, o
governador da Bahia, o vice-governador de Pernambuco, e prefeitos de outros
municípios.
O ministro do Desenvolvimento Social e Agrário, Osmar Terra
(PMDB), foi um dos que participaram da solenidade. Ele afirma que nenhuma
escola no Nordeste ficará sem cisterna para armazenar água. "São sete mil
escolas com cisternas. Vamos comprar 76,5 mil cisternas para famílias".
Relação com o congresso
Esta foi a segunda visita de Temer ao Nordeste desde que
assumiu o comando do país, após o impeachment de Dilma Rousseff (PT). Ele
ressaltou a importância do bom diálogo com o Congresso Nacional para aprovar as
medidas necessárias para tirar o país da crise.
"Nós estamos em uma recessão muito grande e nós temos
que combatê-la. E para combatê-la, nós temos que ter uma interlocução muito
grande com o Congresso Nacional. E para ter essa interlocução, nós precisamos
ter diálogo. Então, primeira palavra que movimenta, que mobiliza o nosso
governo, é a palavra diálogo. Nós conversamos como ninguém com o congresso
nacional", disse.
"Na democracia é assim, ninguém governa sozinho. Você
governa com o Congresso Nacional e graças a Deus e graças a compreensão do
Congresso Nacional, as medidas que temos mandado para lá têm sido rapidamente
aprovadas com índice superior a 88%. É o maior índice de apoio que o Executivo
Federal teve ao longo dos tempos”, avaliou o presidente.
Protesto
Enquanto acontecia o evento para o anúncio da verba de
combate à seca, dezenas de pessoas protestavam do lado de fora. Foram cerca de
150 manifetantes, segundo os organizadores. A Polícia Militar não deu
estimativa.
Com faixas, cartazes e um carro de som, eles pediam a saída
de Temer da presidência da República. O estudante de sistemas de informação
Arany Fernando, 22, do Instituto Federal de Alagoas (Ifal), levou um cartaz com
uma mensagem dizendo que o governo de Temer era um 'golpe no Brasil'.
"Estou aqui para lutar pelos nossos direitos trabalhistas e contra a
reforma da previdência", afirmou.
ESTAÇÃO REBATIZADA
Do UOL
A estação Vila Mariana, na linha 1-azul do Metrô de São
Paulo, na zona sul da capital paulista, pode ser rebatizada pela primeira vez
desde sua inauguração há 43 anos. Se um projeto de lei aprovado na Assembleia
Legislativa sair do papel, a parada ganhará uma designação em homenagem a um
pastor evangélico, passando a se chamar Enéas Tognini-Vila Mariana.
A proposta aguarda sanção ou veto do governador Geraldo
Alckmin (PSDB): o prazo constitucional para a decisão do Executivo paulista é
sexta, dia 30 de dezembro. Mesmo com a possível obstrução do tucano, o projeto
ainda poderá ser promulgado à revelia pelos legisladores, como já aconteceu,
por exemplo, em 2011, com a estação Jardim São Paulo-Ayrton Senna.
A medida é criticada por quem frequenta a estação e também
pelo Metrô, pois a mudança implicaria em gastos em um momento em que a empresa,
controlada pelo governo estadual, enfrenta uma crise orçamentária.
Questionado por telefone ou por e-mail pela reportagem a
respeito de quanto custaria e de quanto tempo levariam as mudanças, o Metrô
informou, por meio de sua assessoria, que não se pronunciaria. Indagada também
sobre quanto tempo e quanto custou a última mudança, a empresa também não se
manifestou.
O deputado que propôs a alteração, André Soares (DEM),
justificou a ideia argumentando que o homenageado, um pastor batista nascido em
Avaré (SP) em 1914 e morto no ano passado, foi, nos anos 1960, "um dos
grandes líderes do avivamento espiritual, que originou a Convenção Batista
Nacional (CBN)".
Soares, que é filho do pastor neopentecostal Romildo Ribeiro
Soares, conhecido na TV como missionário R. R. Soares, alega ainda que Tognini
"tem especial relação com a região objeto da homenagem", afinal, a
Igreja Batista do Povo, fundada por ele, fica na rua Domingos de Morais, perto
da estação Vila Mariana.
Passageiros contrariados
"A mudança não vai melhorar nada para nós, fora que o
nome atual já é um ponto de referência conhecido por muita gente", disse a
doméstica Marinês Santos, 49. Já o microempresário Wilson Alves Junior, 33,
afirmou que as prioridades dos deputados deveriam ser outras. "Moro em Francisco
Morato (município ao noroeste da capital paulista) e a linha que serve a cidade
precisa de muitas melhorias, porque os trens são umas sucatas que quebram
sempre. Por que eles não se preocupam com esse tipo de coisa em vez de ficar
mudando nome de estação?"
"Sou contra dar nomes de pessoas para lugares públicos
assim", disse o técnico em contabilidade Jorge Takashi, 75.
A estagiária em Direito Simone Soares, 52, também criticou:
"Mesmo sendo evangélica, eu não apoio, porque a glória vai só para a
família do homenageado."
A reportagem entrou em contato por telefone e e-mail com a
assessoria do deputado André Soares, mas não obteve resposta ao questionamento
que fez sobre a relevância social de seu projeto de lei. Já o Palácio dos
Bandeirantes limitou-se a responder que o projeto de lei "foi encaminhado
pela Assembleia no dia 9 de dezembro e está em análise na Procuradoria-Geral do
Estado" e que o prazo para a manifestação do governo é de 15 dias úteis.
Procurado, o presidente da Assembleia, Fernando Capez (PSDB), para cujo
gabinete a proposta retornará após a apreciação de Alckmin, não se manifestou
sobre o assunto.
"Gastos significativos"
A Secretaria Estadual dos Transportes Metropolitanos,
responsável pelo Metrô e pela CPTM (Companhia Paulista de Trens
Metropolitanos), informou, por meio de nota, que qualquer "alteração no
nome das estações do Metrô e da CPTM implica em gastos significativos para a
substituição da comunicação visual de todas as estações e trens, mapas dos
arredores, além da adaptação das estruturas de sinalização do nome da estação,
que foram projetadas para atender a uma determinada quantidade de caracteres".
A pasta sustenta ainda que os nomes das estações já estão
"consolidados e se tornaram referências da cidade, de modo que os mapas
urbanos veiculados pelas mídias também precisam ser alterados, incluindo os
mapas de trólebus, ônibus municipais e intermunicipais". O texto informa
também que a nomeação das estações "é precedida de estudos
histórico-geográficos e pesquisas junto à população local, além de considerar
critérios de fácil leitura, pronúncia e memorização".
Troca-troca
Não é a primeira vez que uma estação corre o risco de ter o
seu nome mudado, mesmo depois de veto do Executivo. Em 2011, o Metrô foi
obrigado a alterar o nome da estação Jardim São Paulo, também na linha 1-azul,
para Jardim São Paulo-Ayrton Senna, após a Assembleia derrubar o veto
governamental a um projeto de lei apresentado em 2009 pelo deputado Campos
Machado (PTB).
Na época, a troca gerou críticas, posto que além de
acarretar custos para o sistema, o nome do piloto já denomina outros
logradouros na cidade, como uma rodovia e um túnel sob o parque do Ibirapuera,
na zona sul, o que pode provocar confusões de toponímia.
Em 2008, o próprio governo do Estado, então administrado por
José Serra (PSDB), decidiu alterar o nome da estação Imigrantes, na linha
2-verde, para Santos-Imigrantes, em homenagem ao time de futebol da Baixada
Santista. Dois anos antes, a estação Bresser, na linha 3-vermelha, passou a se
chamar Bresser-Mooca, após um projeto apresentado pelo ex-deputado estadual
Romeu Tuma (PMDB).
Naquele mesmo ano, a estação no extremo oeste da linha 3,
Barra Funda, já havia ganhado um acréscimo ao seu nome para condecorar outro
time, o Palmeiras. A mudança ocorreu depois de uma canetada do então governador
Cláudio Lembo (PFL), que era vice de Alckmin.
Desde 2013, três estações da CPTM tiveram seus nomes
modificados em função de projetos apresentados, defendidos e aprovados por
deputados estaduais. A estação Ribeirão Pires, na linha 10-turquesa, se tornou
Ribeirão Pires-Antônio Bespalec, em homenagem a um político e arquiteto da
região. No mesmo ramal, a estação São Caetano passou a ser designada São
Caetano-Prefeito Walter Braido. No ano passado, a estação Mooca virou
Juventus-Mooca, para homenagear o time de futebol.
Somente nos últimos dois anos, dez projetos de lei foram
apresentados na Assembleia Legislativa com o intuito de modificar nomes de
estações de metrô e trem.
UM PREFEITO IRRESPONSÁVEL
Artigo de Antonio Risério, Blog do Noblat
São Paulo: um prefeito irresponsável
A grossura pessoal, a
completa falta de educação urbana e a incapacidade de pensar coletivamente
levou a grande maioria dos motoristas de São Paulo a detestar Fernando Haddad.
Entre outras coisas, por ele ter determinado a redução do limite de velocidade
em algumas avenidas.
Para quem não se lembra, até Lula (sujeito bancado durante
anos pela “elite branca” que fingia combater) chegou a debochar dessas medidas
de Haddad, em discurso na campanha de 2016. Mas, agora, o prefeito eleito de
São Paulo promete levar à prática o retrocesso que Lula queria: os carros
voltarão a correr mais naquelas avenidas paulistanas.
Ao fazer isso, o tal do João Dória vai decididamente na
contramão do padrão que se vai estabelecendo atualmente nas democracias mais
ricas e avançadas do mundo. Como nos casos de Londres, cujo limite de
velocidade chega a ser de 32 km, e de Nova York, onde, na maior parte das vias,
o limite é de 40 km. Tudo em nome do bem-estar da população.
Quanto mais alta a velocidade, maior o número de “acidentes”,
claro. Só idiotas (de direita ou de esquerda) não querem ver isso. E escrevo a
palavra “acidente” entre aspas, por uma razão óbvia. Os estudiosos da vida
urbana sabem que a maioria das merdas que são feitas no trânsito brasileiro não
cabem na definição de “acidente”.
É óbvio. Olhem no dicionário: “acidente” significa
acontecimento casual, fortuito, inesperado. Algo que, por sua
imprevisibilidade, somos obrigados a creditar na conta do acaso. Ser atingido
por um raio, por exemplo, é um acidente.
Mas ser atropelado por um automóvel que fura um sinal
vermelho a 80 km/h, não – é uma ocorrência perfeitamente previsível. Nada tem
de verdadeiramente acidental. Um motorista que faz isso está muito mais próximo
da figura do crime premeditado do que da natureza do acidente.
Aumentar a velocidade das Marginais paulistanas não implica,
portanto, simplesmente concorrer para aumentar o número “acidentes”. Mas, isto
sim, incrementar a estatística de fatos absolutamente previsíveis e esperados,
aumentando o número de mortes e aleijões na população paulistana.
Ou seja: em vez de zelar pela gente da cidade, Dória vai
aumentar a dose de risco na vida de todos. É o contrário total do que qualquer
prefeito sério deveria fazer. E Dória terá de ser responsabilizado por isso.
Não sei se será possível responsabilizá-lo juridicamente
pelos crimes que serão cometidos. Mas moralmente, não tenho dúvida: ele está
responsabilizado desde já.
PARA NÃO FALAR DE ÁRVORES
Apesar do título acima, o texto não vai abordar a natureza,
o meio ambiente ou correlatos. Tampouco pretende detonar os faiscantes
pinheiros de plástico natalinos, uma vez que hoje é 25 de dezembro. Feliz Natal
para quem tem algo a festejar, portanto.
O assunto é mais pesado. "Aos que vão nascer", o
célebre poema de Bertold Brecht escrito em 1939, procurou despertar da cegueira
nazista a sociedade alemã às vésperas da II Guerra. Basta citar as duas
primeiras estrofes da obra, em tradução de Paulo César de Souza, para
devolver-lhe atualidade num mundo inteiramente
diverso ao de 77 anos atrás:
"É verdade, eu vivo em
tempos negros.
Palavra inocente é tolice.
Uma testa sem rugas indica insensibilidade.
Aquele que ri, apenas não recebeu ainda a terrível notícia.
Que tempos são esses, em que falar de árvores é quase um
crime pois implica silenciar
sobre tantas barbaridades?
Aquele que atravessa a rua tranquilo.
Não está mais ao
alcance de seus amigos
Necessitados?"
Os países e sociedades que se despedem deste indigesto ano
de 2016 estão à deriva. Em gestação está uma nova (des)ordem mundial de
características inquietantes. A partir de
janeiro o calouro Donald Trump assume o comando da Casa Branca e do
maior arsenal nuclear do planeta, que ele pretende incrementar. "Que haja uma corrida
armamentista. Iremos superar a todos", trompeteou o futuro presidente esta
semana.
Trump admira líderes autoritários e acredita ser tão sagaz
quanto o veterano rapozão russo Vladimir Putin. Tem pretensões também
de mostrar à China de Xi Jinping que agora a "América voltará a ser
grande". Embora sejam radicalmente
diferentes no estilo, índole, agenda
política ou na sociedade que representam, os três líderes
têm em comum a exaltação da nação. Perigo à vista para 2017.
"Infeliz a terra que não tem heróis", proclama o
discípulo Andrea em "A vida de Galileo", de Brecht, escrito também
sob o Terceiro Reich, e que recebe do Cientista a devida resposta:
"Infeliz é a terra que precisa de heróis".
Como já escreveu o historiador briComo já escreveu o
historiador britânico Timothy Garton Ash, professor de História Europeia na
Universidade de Oxford, já virou truísmo afirmar que heróis costumam levar nações à guerra enquanto paz e
democracia são preservadas por uma cidadania bem informada e participante. Paz e democracia
exigem, sobretudo, líderes avessos a populismos, norteados primariamente pelo
respeito ao estado de direito, mesmo quando as
leis forem eleitoralmente inconvenientes.
A Europa tem há onze
anos um líder mundial de uma raça quase em extinção. Ou tinha, até a noite
da segunda-feira - a chanceler da Alemanha, Angela Merkel. Firme, poderosa a
bordo de economia nacional sempre robusta, e até agora blindada contra as
concessões eleitoreiras que derrubaram seus vizinhos no continente.
Mas a partir do momento em que o tunisiano Anis Amri embicou
seu caminhão da morte contra os festeiros na praça Breitscheidt, em Berlim, e
conseguiu escapulir por três dias cruzando duas fronteiras até ser morto em
Milão, a Europa democrática e liberal pode ter começado a perder seu principal
eixo. Muito dependerá do resultado das eleições gerais de setembro próximo na Alemanha.
Se Merkel vencer pela quarta vez, terá continuidade a
difícil construção de uma sociedade
que ambiciona uma forma de
viver "livre, unida e aberta", como propõe a chanceler.
A firmeza de Merkel
sob pressão é conhecida. Sua alergia a nacionalismos também, tanto quanto seu
inconfundível penteado capacete. Ela sabe que os serviços de inteligência do país escancararam falhas e
deficiências no atentado de Berlim e urge aparelhar-se. Também sabe que ao
abrir as fronteiras para mais de um milhão de refugiados em 2015, ela submeteu
a sociedade alemã a um teste forçado.
Em momento algum, contudo, a estadista cogitou pronunciar
a frase-chavão "Estamos em
guerra", à qual sucumbiram tantos líderes do Primeiro Mundo afetados por
atentados terroristas de grande porte, com as consequências que se conhece.
Declarar guerra ao terror é tão retórico quanto declarar
guerra à criminalidade ou proclamar "vitória" no "Dia D" da
tomada do Morro do Alemão pelas tropas de choque no Rio.
Merkel promete melhor combate aos terroristas e mais
proteção à população, sem flexibilizar
demais as liberdades individuais.
A chanceler sabe que a meta do terrorista, em sua essência,
é aterrorizar matando, e não tomar o poder. Merkel também sabe melhor do que seus pares europeus
e americanos que o inimigo à espreita de falhas da democracia liberal, pronto
para assumir o poder, é outro: algum líder xenófobo populista.
Candidatos não faltam.
E para concluir, um pouco mais de Brecht, em tom mais
otimista:
"General, o homem é útil.
Ele pode voar e ele pode matar.
Mas ele tem um defeito: ele pode pensar."
Dorrit Harazim é jornalista
RISCO PARA O FUTURO DO PLANETA
Christianne Maroun, O Globo
Ao que tudo indica, o novo presidente dos Estados Unidos,
Donald Trump, vai mesmo cumprir sua promessa de campanha de se lixar para a
influência do homem nas mudanças climáticas, especificamente quando o tema é
indústria fóssil.
Myron Ebell, seu indicado para a transição na agência de
proteção ambiental do país (EPA) é um cético sobre nossa influência no clima do
planeta e lendário crítico das tratativas mundiais para mitigar o impacto dos
processos da nossa sociedade nessa questão ambiental global.
Mas o quanto isso importa para nós aqui no Brasil — e para o
resto do mundo? Para responder a esta pergunta, precisamos analisar o impacto
da escolha de Trump sob duas vertentes.
A primeira diz respeito efetivamente às emissões de gases de
efeito estufa dos EUA. O país é o segundo maior emissor mundial desses gases,
muito devido à economia de consumo que é a base estrutural de crescimento do
país. Valorizar a energia fóssil é uma escolha temerária que certamente irá
contribuir para o aumento das emissões dos EUA. Considerando que uma molécula
de CO2 (o principal gás de efeito estufa em termos de volume) fica de 100 a 200
anos na atmosfera da Terra e se mistura completamente e de forma homogênea, não
faz diferença se ela é emitida nos EUA, na África do Sul ou na China. Vai
interferir no clima do mundo todo, inclusive no nosso aqui no Brasil.
A segunda vertente, e talvez igualmente importante, é que a
EPA sempre foi um exemplo para o mundo. Grande parte de metodologias, estudos e
ações efetivamente implementadas nos EUA e no resto do planeta é fruto dos
investimentos em estudos científicos, criatividade e pró-atividade da agência
norte-americana. Colocar a EPA na geladeira fóssil poderá até ilusoriamente aquecer
a economia dos EUA por um tempo, mas o principal aquecimento será o do clima da
Terra. E a mudança do clima afeta a economia, e o mais importante: afeta
diretamente a vida das pessoas, não só dos EUA como em todo o planeta.
Programas inovadores criados pela EPA, como o Energy Star
(1992), que alia a redução de custos à eficiência energética, reduzindo
emissões de gases de efeito estufa e economizando bilhões de dólares para os
americanos, foram implementados em diversos países do mundo, incluindo o Brasil.
Em 2013 foi lançado o Plano de Mudanças Climáticas dos EUA,
uma estratégia com foco na preparação para os efeitos dessas mudanças, redução
da poluição de carbono nos EUA e fornecimento de assistência técnica
internacional. Um programa recente que poderia nos beneficiar e que pode não
ser levado adiante sob a nova direção.
Diante dos fatos atuais, só nos resta torcer para que a
sociedade americana se mobilize para resguardar o que vem sendo feito em prol
da mitigação das mudanças climáticas.
E torcer também para que a EPA seja uma instituição sólida o
suficiente para sobreviver ao governo Trump, sem retrocessos estruturais e com
o menor impacto possível nas ações já implementadas com tanto esforço e
profissionalismo, ao longo de muitas décadas.
Christianne Maroun é professora do curso de Engenharia
Ambiental da PUC-Rio
TENTEMOS EM 2017
Há décadas, intelectuais e políticos alertam para a
necessidade de reformas estruturais, sem as quais a nação brasileira
continuaria carecendo de forças de coesão e de dinamismo. Fomos forjados sob o
signo da escravidão e da exclusão, da concentração de renda e da segregação
educacional, usando políticas fisiológicas e patrimonialistas de uma
aristocracia que sobrevive ao Império. Não somos ainda uma República com coesão
nacional. Por falta de coesão, usamos inflação e endividamento público para
atender interesses divergentes. Quando isso se esgotava, usamos ditaduras, para
impor coesão forçada.
Basta olhar ao redor para ver que há um clima de
desagregação no ar: corrupção endêmica; violência urbana generalizada como uma
guerra civil sem ideologias, nem religiões; partidos sem propostas, nem
identidades; políticos sem credibilidade; decisões judiciais precipitadas,
legislando no lugar do Congresso e sendo desrespeitadas por parlamentares.
Some-se a isto, a baixa produtividade e baixa propensão à
poupança, a permanência da desigualdade social, a recessão econômica, o
desemprego catastrófico, o endividamento do Estado, das famílias e das
empresas; a miséria do quadro educacional. Sobretudo, um país dividido em
corporações, sem preocupação com os interesses nacionais de longo prazo, e um
quadro ideológico de sectarização dogmática, sem debate em busca de
alternativas. Um país sem amálgama de longo prazo, perdido no imediatismo de
promessas impossíveis para o futuro e sem qualquer aceitação para os
necessários sacrifícios no presente.
Mas o Brasil não pode continuar adiando sua coesão. Deve
entender e querer superar o risco da desagregação, abrir diálogo entre o que
ainda resta de líderes, independente de terem votos e serem políticos,
reconhecer e convocar o país para enfrentar as dificuldades imediatas: levar
adiante e com todo rigor as operações da luta contra a corrupção; realizar as
reformas que o país precisa para liberar seu futuro: fiscal, progressista e sem
as brechas que beneficiam aos ricos, trabalhista, previdenciária, propondo
também as necessárias reformas estruturais sempre adiadas: garantia de terra
para quem dela ainda precisa no campo; eficiência da máquina do Estado para
dar-lhe baixo custo e para servir com qualidade aos usuários dos serviços
públicos; transformação educacional, para assegurar a toda criança escola com a
mesma qualidade que o Brasil precisa para aglutinar e desenvolver sua sociedade
e economia.
Esta é a proposta que podemos tentar em 2017: barrar o atual
rumo da decadência e da desagregação, iniciando um novo rumo para o Brasil.
Cabe aos atuais líderes convocar a população para uma aglutinação em torno aos
sacrifícios de hoje, com esperança nos benefícios futuros. Sem isso, que é
difícil de realizar, vamos cair na desagregação ou antecipar eleições gerais,
para todos os cargos federais, na tentativa de fazer a necessária aglutinação
por novos líderes com credibilidade.
BRASIL CORRE PERIGO
Paulo Nogueira Batista Jr., O Globo
O Brasil corre riscos sérios. Estou longe, mas acompanho
sempre que posso o que está acontecendo aí — e com preocupação cada vez maior.
A situação mundial, marcada por aguda polarização, oferece grandes perigos para
nações fragilizadas por conflitos internos. Existem certamente casos mais
graves que o brasileiro, países destroçados por intervenções externas e/ ou
crises domésticas: Síria, Iraque, Líbia, Grécia — para citar casos mais
notórios.
Não chegamos a esses extremos, mas não há como negar que o
nosso país está em perigo. Dos Brics, o Brasil é no momento o mais vulnerável.
E repare, leitor, que a situação da Rússia e da África do Sul é bem complicada.
A China também enfrenta desafios econômicos, institucionais e políticos. A
Índia acaba de lançar uma reforma monetária radical, com efeito
desestabilizador. Em todos os quatro países, a corrupção é problema grave.
Mas, entre os Brics, o Brasil é “hors concours”. Não
necessariamente em corrupção, mas na fragilidade do quadro econômico, social e
político. As razões parecem claras. Primeiro, a intensa polarização interna. O
que antes era patrimônio dos nossos vizinhos ao Sul — a incapacidade crônica
dos argentinos de conciliar e chegar a entendimentos — parece ter sido
importado maciçamente pelos brasileiros. A intolerância, o colapso do diálogo,
a perda de legitimidade de instituições fundamentais, o enfraquecimento da
democracia — tudo isso representa um imenso perigo para a nação brasileira. E
mais o seguinte: o triunfo da mais profunda e radical ignorância em diversos
campos da vida nacional.
A essa degradação política e social se acrescenta uma das
piores crises econômica da nossa história. Recessão forte e prolongada,
desemprego crescente, redução dos salários reais — “em casa onde falta pão...”
A crise econômica alimenta a crise política, e vice-versa. Nesse ambiente, os
governos brasileiros perderam apoio e legitimidade, a classe política atingiu o
seu nadir, a Justiça perdeu o Norte.
Criou-se, leitor, um terreno fértil para a intervenção
estrangeira — e era neste ponto que queria chegar. A intervenção externa não
precisa ser ostensiva — e muito menos militar. Ela toma formas mais sutis. Com
o enfraquecimento dos governos e a crise econômica, fica mais fácil para
investidores de outros países, não raro com apoio estratégico de seus governos,
aterrissar no Brasil e comprar empresas, terras e outros ativos brasileiros sem
controle ou restrições — e na bacia das almas. O Brasil está à venda, em
liquidação? Quem protege os nossos interesses? Quem nos representa no plano
internacional?
Leitor, não se iluda, para determinados fins estratégicos não
há substituto para o Estado nacional. Os setores privados, as organizações da
sociedade civil, as universidades, os intelectuais, os artistas — todos eles
carregam de alguma forma, bem ou mal, o estandarte nacional, por onde quer que
andem e circulem. Mas não existem instâncias supranacionais a quem um país
possa confiar a defesa dos seus interesses nacionais e dos seus objetivos
vitais. Ou existem? Peço ao leitor que me aponte uma, pelo menos uma.
As entidades multilaterais mais relevantes são internacionais,
vale dizer são associações entre nações, entre Estados — e delas só se
beneficiam aqueles países que têm um mínimo de coesão interna e um Estado
razoavelmente estruturado.
O Brasil precisa encontrar um meio legítimo de superar o
quadro de polarização destrutiva e frear o processo de desintegração em curso.
Paulo Nogueira Batista Jr. é vice-presidente do Novo Banco
de Desenvolvimento, sediado em Xangai, mas expressa seus pontos de vista em
caráter pessoal
segunda-feira, 26 de dezembro de 2016
O BÊBADO E O JORNALISMO
Elstor Hanzen, Observatório da Imprensa
“O modo como enxergamos o mundo seria muito diferente se
todos os nossos julgamentos pudessem ser isolados da expectativa e baseados
apenas em informações relevantes”, ou ainda: “É fácil seremos vítimas das
expectativas, e é também fácil explorá-las diante dos outros.” Essas são
reflexões trazidas pelo físico estadunidense Leonard Mlodinow, no livro O andar
do bêbado, publicado em 2009. Em palavras gerais, a obra trata de como fatores
aleatórios influenciam no resultado de sistemas complexos, como na nossa vida,
por exemplo. Especificamente, Mlodinow traz importantes lições para o
jornalismo, para tal apresenta resultados que desmistificam os salvadores da
pátria, as celebridades, os gurus do marketing, enfim, contrapõe o mundo da aparência
ao da essência.
O 2016 foi farto de problemas complexos para os quais se
vendeu soluções fáceis e rápidas. Por causa da manifestação de insatisfação da
população com a corrupção e com a crise política e econômica, a saída foi o
impeachment e a instalação de um governante salvador da pátria. E a mídia teve
um papel decisivo nesse processo porque coletou todas as evidências favoráveis
à ideia e, o pior, passou até interpretar indícios ambíguos de modo a favorecer
e respaldar a ideia como solução para a crise.
Por outro lado, não mostrou as contra razões desse processo,
mas que ao longo do ano foram se impondo naturalmente. Portanto, ignorou-se a
premissa básica que diz: para uma ideia ter o mínimo de consistência, é
necessário equilibrar os prós e os contras, contudo, o que se fez foi seguir
apenas o padrão de comportamento observado pelo filósofo Francis Bacon, em
1620. Para Bacon, “a compreensão humana, após ter adotado uma opinião,
coleciona quaisquer instâncias que a confirmem, e ainda que as instâncias
contrárias possam ser muito mais numerosas e influentes, ela não as percebe, ou
então as rejeita, de modo que sua opinião permaneça inabalada”.
Esse comportamento é chamando pelos psicólogos de viés da
confirmação, prática muito presente também nas redes sociais, em que se seguem
pessoas com as mesmas opiniões e preferências, estratagema cada vez mais
reforçado graças ao uso dos algoritmos para juntar um público homogêneo no
espaço online que, em última instância, visa o mercado e o interesse comercial
de grupos empresariais. Segundo tal lógica, quando estamos diante de uma ilusão
– ou em qualquer momento em que tenhamos uma nova ideia -, em vez de tentarmos
provar que nossas ideias estão erradas, geralmente, tentamos provar que estão
corretas. Inclusive, a tendência de confirmação de nossas expectativas não é
nova nem só coisa da internet. Conforme Mlodinow, ela pode ocorrer em várias
circunstâncias, como exemplo, quando um empregador entrevista um candidato a um
emprego, sua propensão é formar uma rápida primeira impressão do sujeito e
passar o resto da entrevista buscando informações que a corroborem.
Mundo da aparência
Quem se serve bem do mundo das aparências e das falsas
expectativas é o marketing. Para ilustrar sua obra sobre o mito das falsas verdades,
Mlodinow apresenta diversas pesquisas e análises realizadas no campo das
marcas. E num estudo feito em 2008, um grupo de voluntários deu nota melhor a
uma garrafa com etiqueta de US$90 que a outra com etiqueta de US$10, embora os
sorrateiros pesquisadores tivessem enchido as duas com o mesmo vinho. Outro
teste foi feito com vodca. De acordo com a descrição da bebida feita pelo
governo da Rússia, ela é neutra e não apresenta aroma, sabor e cor. Mas o
estudo com 21 rótulos diferentes da bebida mostrou resultados curiosos: no
primeiro teste, os rótulos e os preços ficaram à mostra, quando os envolvidos
atribuíram qualidades melhores à medida que o valor era maior e a marca mais
conhecida. Num segundo teste, às cegas, com as mesmas pessoas, a vodca mais
barata recebeu melhor cotação.
Para lembrar que a força das marcas não se restringe a
produtos específicos, evidentemente, basta citar a eleição do prefeito de São
Paulo, João Doria Jr.; e do presidente dos EUA, Donald Trump. O que os dois têm
em comum: são empresários e ex-apresentadores de reality show; portanto, se
beneficiaram fortemente na política devido à construção dos seus nomes pelo
marketing. E o que o jornalismo fez para mostrar a realidade por trás dessas
aparências? Pelo menos aqui no Brasil, praticamente nada.
Já o autor do O andar do bêbado busca uma compreensão mais
ampla para o exposto. Ele avalia que a visão determinística do mercado dá conta
que o sucesso da pessoa e do produto é determinado pelos valores intrínsecos, o
que, em geral, é uma falácia, ressalta ele. Ou seja, na sociedade capitalista
se diz que os valores e os princípios são essenciais, mas se projeta o grau da
celebridade e a quantidade de dinheiro como sinônimo de sucesso. Esse tipo de
sociedade também se apressa em transformar os ricos em heróis e os pobres em
pondes expiatórios.
A origem disso vem da nossa tendência a confiar demais nas
previsões excessivamente precisas das pessoas – comentaristas, especialistas de
finanças, gurus do marketing – cujo histórico, supostamente, demonstra
conhecimento dos assuntos. Mas se visto com mais cuidado, como fazem os
historiadores, apenas se gera uma aparência de inevitabilidade, usando a
estratégia de citar fontes abalizadas pelo mercado e de trazer para o primeiro
plano as forças vencedoras e jogando para o segundo as que foram engolidas
pelas primeiras.
Mundo da essência
O bom jornalismo que procura trazer à tona a essência e a
relevância dos acontecimentos, infelizmente, está em falta nos últimos tempos.
O que se tem visto é a espetacularização dos fatos, a criação de heróis e
salvadores da pátria, publicitação de falsas polêmicas. Tudo isso se
materializou em 2016, quando acompanhamos a cobertura da tragédia com o time da
Chapecoense, a sobreposição de determinados juízes da Lava Jato a suas próprias
instituições ou a dicotomia entre o Congresso Nacional e o STF.
Esse tipo de tratamento dos fatos ajuda pouco a cumprir uma
das essências do jornalismo, levar informações às pessoas para terem sua
independência e se autogovernarem, por exemplo. Ainda mais agora, momento em
que a mídia tradicional – jornal, rádio, televisão – sofre com as
superficialidades, boataria e polarizações das informações publicadas nas redes
sociais. Para fazer frente a tal realidade, dever-se-ia ter como uma espécie de
missão a verificação e a relevância dos assuntos, antes de lançá-los à agenda
pública. Mas o que tem acontecido é o viés da confirmação de algumas verdades,
assim ampliando as falsas verdades e a tão conhecida polarização dos temas nas
plataformas online.
Acompanhar e endossar opiniões diante de movimentos de
ocasião, conforme sopra o vento, não contribui em nada a fortalecer o
jornalismo e preservar seu principal ativo: a credibilidade. Por isso, não
importa quanto a forma de fazer jornalismo e a distribuição da informação
tenham mudado com a nova tecnologia, a essência tem permanecida a mesma:
desmistificar as falsas verdade e fornecer aos cidadãos informações seguras
para tomarem suas decisões. Adotando esta postura, conforme Bill Kovach e Tom
Rosenstiel escreveram no livro “Os Elementos do Jornalismo: o que os
jornalistas devem saber e o público deve exigir”, pode até não se alcançar a
verdade, mas o público sabe reconhecer se se chegou perto – quando fontes
autorizadas, pesquisa exaustiva e métodos transparentes foram aplicados no
processo e de modo honesto.
Em 2017, para não continuar neste movimento aleatório,
culpando a crise econômica e as redes sociais e se chocando contra todos os
obstáculos que encontra pelo caminho sem saber aonde irá chegar, como o andar
do bêbado, o jornalismo precisa deixar de lado o papel do marketing e se
dedicar a desvendar os temas que de fato influenciam e ajudam a construir nossa
cidadania. Só assim a notícia será relevante e servirá como base nas decisões
da vida.
Elstor Hanzen é jornalista e especialista em convergência de
mídias
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